segunda-feira, 23 de janeiro de 2023

ARTIGO - Os Cardeais e bispos não são "príncipes" nem podem viver como "faraós", disse o Papa Francisco. (Padre Carlos)

 


Ou os homens perdoam uns aos outros ou terão de criaram o inferno aqui na terra.

 


Mesmo sabendo que alguns temas não correspondem os interesses de certos leitores, não posso deixar de abordar neste espaço as inquietações do presente e o futuro do cristianismo. Depois de abordar as mudanças que o Concílio representou para a Igreja no século passado não podemos deixar de chamar a atenção para a necessidade de uma série de reformas urgentes que a Igreja está precisando neste novo milénio e como podemos abrir esta discussão no meio acadêmico e clerical.

Hoje, os cristãos podem mais seguramente afirmar: ou os homens perdoam uns aos outros ou terão de criaram o inferno aqui na terra. Hoje, temos a dimensão que vivemos numa aldeia planetária e esta certeza tem levado o homem a entender que somos forçados a serem solidários uns com os outros e, para não morremos, estamos condenados a unir-nos e a criar um governo mundial que tenha os meios de ser obedecido.

Como Igreja, precisamos "inventar o futuro": a partir do caminho da comunidade de fé, à luz da história e seguindo e exprimindo as inquietações do nosso tempo. Para aprofundar este tema vou me apropriar da pergunta que Jean Delumeau fez: "Qual é o futuro de Deus?" Ora, quando abrimos o debate a respeito da crise atual do cristianismo e da Igreja, na difícil dialética cristianização-descristianização, podemos cometer a gafe de esquecer que, antes do século XIV, a Europa, segundo, G. Duby, não apresentava” aparências de uma cristandade. O cristianismo não era plenamente vivido senão por raras elites." Lutero também escreveu: "Temo que haja mais idolatria agora do que em qualquer outra época." Por isto concordamos com Delumeau da necessidade que estas reformas transcenda a eclesiologia e possa chegar a outras áreas, para não cair na tentação de certas idealizações e dogmatismos. Por isto, hoje para a Igreja é mais importante "desaprender", não idealizar o passado.

Temos que entender que o grande mal do cristianismo ao longo da história sempre foi a sua ligação ao poder. Até hoje vivemos as consequências de uma das mais trágicas falsas vias para as Igrejas cristãs que foi depois do fim das perseguições, a ligação entre o poder imperial romano e a hierarquia eclesiástica, simbolizada e fortificada pela coroação de Carlos Magno pelo Papa.

Não podemos esquecer que sempre houve, no Império Romano e fora dele, ligação entre os poderes religiosos e político. Foram, por isso, necessários muitos séculos e conflitos incessantes para que “o religioso e o político aceitasse por fim distanciar-se um do outro, num equilíbrio, aliás, instável e que é necessário reajustar continuamente”. De qualquer modo, desde o início do século IV, a Igreja tornou-se um poder. Ora, esta relação perigosa, que durante muito tempo alimentou uma visão distorcida do serviço do sacerdócio, ainda não terminou.

A pesar do testemunho de fé e santidade de muitos missionários durante a colonização em todo o mundo, temos que admitir que a sua grande fraqueza fosse constituída em poder.

Por isto, não podemos falar em um novo Concílio sem falar em abandonar o poder. Só assim, praticando a humildade a Igreja conseguirá de novo convencer e dar-se a si mesmas novas estruturas mais flexível do que no passado e, portanto, capazes de evoluir.

Devemos nos perguntar: como foi possível o movimento iniciado por Jesus ter hoje um Vaticano?! Seja como for, podemos dizer, a história é o que é e o que se impõe é uma revolução, com modos democráticos de governo eclesial, para a simplicidade, a transparência, o serviço. Cardeais e bispos não são "príncipes" nem podem viver como "faraós", diz Francisco. E as nunciaturas só poderão justificar-se enquanto serviços humildes de pontes para o diálogo e a paz mundiais.

 

 


domingo, 22 de janeiro de 2023

ARTIGO - A situação desumana dos yanomamis é uma vergonha para toda a Nação. (Padre Carlos)

 



Bolsonaro parabenizou a Cavalaria Americana por ter matado os indígenas nos Estados Unidos!

 


 

Quando o presidente Lula convidou o cacique Raoni Metuktire, de 90 anos, líder do povo Kayapó; para subir a rampa, não era um gesto retórico para embelezar a cerimoniaria, ele falava para os brasileiros e para as autoridades de diversos países do mundo que se encontrava presente, que as prioridades do Estado Brasileiro estavam mudando e seu compromisso se estendia também aos excluídos desta Nação.  Assim, ao tomar conhecimento da situação dos Yanomami, povo que vive uma crise sanitária que já resultou na morte de 570 crianças por desnutrição e causas evitáveis, nos últimos anos, declarou emergência de saúde pública no território indígena yanomami e anunciou auxílio aos habitantes da região e combate ao garimpo ilegal.

Estas terras em que se encontra próximo à reserva dos yanomami são marcadas por extrema pobreza, desta forma a ação do Estado se estende aos 30 mil habitantes de toda a região. Esta iniciativa foi necessária depois que o governo tomou conhecimento que nas terras indígena yanomami tem atualmente crianças e idosos em estado grave de saúde, principalmente com desnutrição grave, malária e infecções respiratórias. Este cenário é tão crítico ao ponto de o Ministério da Saúde ter decretado estado de emergência para combater a falta de assistência sanitária na região. Lula disse ter visto durante a semana fotos que o abalaram e que a situação encontrada foi de abandono. “Se alguém me contasse que aqui em Roraima tinha pessoas sendo tratadas de forma desumana, como vi o povo yanomami ser tratado aqui, eu não acreditaria", disse o presidente.

Lula ainda criticou o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), ao dizer que o governo mudou e que a atual gestão vai agir com seriedade no "tratamento do povo que esse país tinha esquecido".

Esta mudança de mentalidade e ação política esta relacionada às prioridades de cada governo. Para o ex-presidente Bolsonaro, estas pessoas deveriam ser mortas. Por isto, quando era dep. federal, parabenizou a Cavalaria Americana por ter matado os indígenas nos Estados Unidos e por isto eles não tem mais "esse problema em seu país". O então deputado Jair Bolsonaro ainda lamentou que a cavalaria brasileira não tivesse agido da mesma forma. "Foi incompetente", sentenciou.

Estas palavras de Bolsonaro me lembraram, das conversas que tinha com um monge de Taizé. Certa vez ele me falou que em Birkenau, o campo de extermínio pertencente ao complexo de Auschwitz, jaz uma lápide precisamente no sítio onde antes funcionaram as câmaras de gás e onde se lê: “Permita-se que este local, onde os nazis assassinaram cerca de um milhão e meio de pessoas, homens, mulheres, crianças, sobretudo judeus, de vários países da Europa, seja um grito de desespero e um sinal de alerta para a humanidade”.

A situação desumana que os yanomamis estão vivendo, bem como as mortes de crianças e idosos em decorrência da desnutrição grave causada pela fome, malária e infecções respiratórias, não se repita jamais.

 


ARTIGO - Precisamos repensar novas formas de luta, para repensar a sociedade. (Padre Carlos)

 


Precisamos transcender os nossos interesses corporativistas.

 



Nos momentos conturbados em que vivemos, não poderia como professor de filosofia deixar de chamar a atenção dos leitores para um fato que preocupa não só a mim, mas a todos que, trabalham com as ideias de utopias e distopias, falo do presente e o futuro das novas gerações.

As crises econômicas e as recessões, decorrente de políticas e políticos que em nada têm contribuído para uma sociedade justa, tem se aproveitado desta inercia do movimento popular e por está razão está muito longe de querer de fato essa justiça social, tirando partido e escondendo as justas lutas dos diferentes setores da sociedade brasileira, sem que partidos e sindicatos tomem a sua dianteira nestes movimentos.

Vivemos uma fase na democracia em que todos são obrigados a refletir sobre o caminho que pretendemos percorrer, bem como, identificar nestes tempos difíceis, quais os partidos,movimentos e sindicatos precisam se renovar sob pena de serem “engolidos” por movimentos populistas que ganham cada vez mais força. Repensar formas de luta, repensar o modelo de sociedade é urgente.

Tudo se transformou num espetáculo e só assim tem eco. Os cidadãos divorciaram-se dos valores, das lutas refletidas, da consciência de classe e quando a luta existe, para que perdure e tenha seguimento e algum resultado, o espetáculo tem que continuar… Os partidos políticos e os sindicatos comprometidos com a classe estão perdendo esta luta “corrida”. Ou se reinventam ou teremos o populismo à porta! Não quero aceitar, mas penso que este é o tipo de caminho que conduz ao totalitarismo!

Vejo esta necessidade devido à mudança de governo e a experiência vivida nos anos 2000. O sindicalismo brasileiro viveu uma inflexão em sua trajetória neste período quando comparado com o momento de recrudescimento das lutas sindicais no final dos anos de 1970 e até meados da década de 1980, com elevado número de greves e padrão altamente conflitivo na relação capital/trabalho.  Vejo muito destes pontos citados aqui na forma de luta travadas pelos professores. Nestes tempos difíceis, é fundamental trazer a sociedade civil para dentro das pautas. É preciso entender que o mais importante do que as reivindicações corporativas, são o que dá sentindo ao todo e assim, precisamos incorporar bandeiras e pontos tão importantes como salarial: por uma escola melhor, com mais condições e com mais dignidade! Uma luta que possa juntar professores monitórios, funcionários administrativos, pais, alunos, políticos e até intelectuais.

Assim podemos vê que as experiências de luta precisam transcender os meus interesses e que os motivos da luta não podem ser corporativistas, mas deverá está aberto para construir algo melhor para todos.

 


sábado, 21 de janeiro de 2023

ARTIGO - Terror e religião: foram os componentes dos atos extremistas no DF. (Padre Carlos)



Discurso religioso agiu como motivador ideológico



Avaliar os últimos acontecimentos que fizeram a Capital Federal ser invadidas por um grupo de fanático agindo como se estivessem em uma “guerra santa” ou lutando pela pátria, seria necessário mais que um simples cientista político, ele precisaria da ajuda de outros profissionais e em especial da teologia para interpretar tais fenômenos. Como teólogo podemos afirmar que o discurso religioso tem agido como  um grande motivador ideológico na política brasileiro. E quando falo isto não estou só me referindo  aos atos violentos vistos em Brasília, falo da capacidade destes pastores de pequenas e médias Igrejas conseguirem mobilizar a nível nacional, algumas pautas morais. Isto tem lavado cada vez mais a discursão a respeito da forma como a ultradireita tem buscado construir seu projeto, trazendo a bandeira do  conservadorismo na sociedade brasileira. Para potencializar estes discursos, os políticos destas igrejas contam no meio evangélicos, como simpatizantes de diversos movimento, podemos conferir figuras do universo gospel e pastores de igrejas locais, sem alcance nacional.


Não podemos negar que nos últimos anos temos presenciado nos cultos evangélicos, uma narrativa de embate que acionam um ideário de luta do bem contra o mal, esta visão maniqueísta de caráter escatológico têm sido propagadas por lideranças evangélicas bolsonaristas, capazes de mobilizar multidões de fiéis e com grande influência política.

É o caso do ex-senador Magno Malta, que postou um vídeo no qual aponta as manifestações como o “desespero de um povo que não foi ouvido” e do pastor e televangelista Silas Malafaia, da Assembleia de Deus Vitória em Cristo, que tem pregado nos seus cultos que  a esquerda já tinha feito ocupação  em prédios públicos sem que fosse chamada de antidemocrática e tachou de antidemocráticos os inquéritos conduzidos pelo ministro do STF, Alexandre de Moraes, ressaltando que é “contra os excessos”, mas que a “paciência do povo tem limites”.

Essas lideranças podem não ter participado dos atos de depredação, mas pavimentaram o caminho, legitimando os acampamentos bolsonaristas há meses e atos dos extremistas. Eles têm propagado um discurso de legitimação da morte e da destruição, que é antibíblico e anticristão.

Não se trata de uma questão teológica e sim penal. Seus fieis talvez não saiba , mas estes pastores tem a obrigação de saberem  que , pelo Código Penal e pela Lei de Segurança Nacional (LSN), pedir intervenção militar é crime, Os artigos 22 e 23 da LSN punem, com reclusão de 1 a 4 anos, incitar à subversão da ordem política ou social e à animosidade entre as Forças Armadas e as instituições. Fora isso, o Código Penal pune, no artigo 287, a apologia ao crime. Cabe ao MP impedir esses movimentos que são, muitas vezes, capitaneados por políticos de utradireita que afrontam a todo o momento a nossa Constituição e o ordenamento jurídico.


O discurso religioso, descolado de uma formação de base, de conceitos de cidadania, gera o cenário ideal para cenas que a gente viu, com pessoas cantando louvores e orando, como se estivessem ganhando uma guerra.”

Pelo menos quatro pastores donos de igrejas foram presos pela Polícia Federal por terem participado dos atos golpistas em Brasília no dia 8 de janeiro, esperamos que os outros espalhados por este país a fora sejam também responsabilizados.

 

 

sexta-feira, 20 de janeiro de 2023

ARTIGO - O General Etchegoyen, quer que o presidente Lula anistie os militares que participaram da tentativa de golpe. (Padre Carlos)

 


O General prega uma Lei da Anistia nos moldes da lei” de 1979

 


Esta manhã fui surpreendido com as notícias que o General  Etchegoyen, quer que o presidente Lula anistie todos os militares que participaram, no dia 08 de Janeiro de 2023 em Brasília, da tentativa de Golpe de Estado junto com terroristas bolsonaristas. Segundo o jornalista Bernardo Mello Franco do jornal O Globo, este suposto acordo seria fundamental para pacificar o país. O General tem defendido que o governo Lula repita o mesmo erro que ocorreu quando as forças democráticas aceitaram a imposição da Lei da Anistia de 1979 pelos militares. A Lei da Anistia de 1979 impediu que agentes da Ditadura Empresarial-Militar como militares, policiais federais, civis e militares como também bombeiros e elementos civis fossem julgados por crimes contra a humanidade como sequestro, tortura, estupro e assassinato.

Não podemos esquecer que o Brasil ao anistiar esses criminosos possibilitou que as forças armadas continuassem a articular golpes de Estado como ocorreu em 2016 e pudessem tutelar a República como ocorreu no governo de Temer e no governo Bolsonaro. Quem trabalha ou milita no métier da política sabe que o General Etchegoyen com o General Villas Boas foram um dos articuladores do golpe de 2016 e do returno da República a tutela militar.

Gostaria de esclarecer aos leitores que em nenhuma democracia do mundo generais protegem terroristas, mas no Brasil um certo general protegeu e auxiliou terroristas fascistas que tentaram explodir o aeroporto de Brasília e atacaram a sede dos três poderes numa tentativa de golpe de Estado. Em qualquer democracia estes militares seriam presos, julgados e condenados a penas que poderia ir de prisão perpétua à pena de morte por traição e terrorismo. Por isto é importante identificar estes militares que protegeram e auxiliaram terroristas.

Não podemos fecha os olhos como quer o General Etchegoyen e fingir que nada aconteceu! Se agirmos assim, o país vai virá ruína e se afundar na vala onde a justiça é feita pela quantidade de estrelas ou patente que ostenta na farda.  Diante de tanta violência e evidencias de omissão e falta de profissionalismo com a segurança da res publica coisa do povo, ou seja, as diversas coisas da sociedade pública, às quais todos (o povo) têm igual direito, pedimos nada mais que se faça justiça. Não é uma questão de pacificar e sim de fazer justiça! Por isto, esses militares precisam ser presos e se comprovarem sua participação, expulsos das forças armadas, para que posam pagar suas penas.·.

 

 


quinta-feira, 19 de janeiro de 2023

ARTIGO - Arcebispo Dom Zanoni Demettino Castro, nomeia para o cargo de Chanceler da Cúria Metropolitana uma mulher. (Padre Carlos)

 

É preciso coragem para trazer para Igreja local uma renovação que estamos esperando a mais de cinquenta anos.  

 

 


Ao tomar conhecimento da nomeação para o cargo de Chanceler da Cúria Metropolitana da Arquidiocese de Feira de Santana, a reverendíssima Irmã Teresinha Mattos, fiquei comovido e esperançoso porque percebi que desde os tempos de Constantino, nunca a Igreja esteve tão livre do poder. Mas apesar de está vivendo esta primavera de praga, não se libertou ainda do modelo piramidal. Assim, parabenizo o Arcebispo Dom Zanoni Demettino Castro, pela coragem e vontade de trazer para Igreja local uma renovação que estamos esperando a mais de cinquenta anos.  

Quando chamo a atenção dos leitores para este fato, quero lembrar que a estrutura da nossa Igreja não se adequa aos tempos atuais nem ao Evangelho, já que "a Igreja somos todos nós". De fato, o que é que se constata? "A voz que se ouve na Igreja é a voz de homens celibatários, enquanto a voz das mulheres e a dos homens casados quase não se ouve. Temos de reconhecer que um organismo que se diz católico, portanto, universal, onde mais da metade dos seus membros, as mulheres, e a grande maioria da outra metade, homens casados ou solteiros, mas não celibatários, quase não têm voz, é um organismo um pouco estranho. Raro. Preocupante." Afinal, quem decide na Igreja e como? Poucos homens celibatários e de idade muito avançada. Sim, a Igreja, que representa a sexta parte dos habitantes do planeta, é "uma Igreja piramidal, com um Papa com poderes praticamente ilimitados" ("monarca absoluto", diz o teólogo J. M. Castillo), "uma Igreja gerontocrática, masculina, clerical, europeia, Igreja que é governada, em última instância, por poucas pessoas: o Papa, os bispos em exercício e a burocracia da Cúria Romana". O modo de tomada de decisões na Igreja é "hierárquico, vertical, onde não brilha a transparência, e com exclusão da maioria".

Nossa esperança está na nova geração dos bispos e de uma renovação que crie no seu seio a possibilidade de vivenciar o nosso batismo. Temos que vivenciar dentro da Igreja a Boa Nova de Jesus, para podermos pregar e levar aos irmãos.  Na Igreja, a função do Chanceler é pouco conhecida e muitas vezes vista como um alto funcionário.  Entretanto, a função deve ser vista como um ofício necessário e importante para a organização eclesial diocesana.  .

A vocação profética deste bispo e homem de Deus com este gesto e coragem de nomear esta religiosa, chama a atenção do conjunto da Igreja da necessidade de nos libertarmos do modelo piramidal. Se houvesse mais gestos corajosos como este, entraríamos verdadeiramente vivenciando o Concílio Vaticano II, e entraríamos não só no novo milênio, mas na idade de ouro do cristianismo.

 

 

quarta-feira, 18 de janeiro de 2023

Dai, pois, a Justiça o que é da Justiça e a Política o que é da Política. (Padre Carlos)

 


Filosofia do Direito e o sistema de Justiça




Diante da crise que se estalou no Estado brasileiro, não poderia deixar de fazer uma abordagem filosófica sobre o comportamento dos poderes e a conjuntura que se forma neste momento. Assim, o que mais me tem impressionado na recente crise político-institucional que tem assolado o Brasil é, de novo, a utilização das autoridades judiciais e judiciárias como meio privilegiado de resposta estatal.

Recordemos que, no afastamento de Dilma e de Lula, respetivamente da presidência e do cenário político brasileiro, foi justamente a Justiça que assumiu o papel fundamental. O poder judicial e o Ministério Público interviram, de forma semelhante, em relação àqueles dois políticos, assumindo um papel que, antes, em tais situações, era atribuído aos militares.

Hoje, para fazer frente ao movimento bolsonarista que procura, mais uma vez, interromper o processo democrático, foi, de novo, o sistema de Justiça que foi acionado: o mesmo sistema de Justiça, os mesmos juízes e procuradores. Só que, agora, agindo, aparentemente, em sentido contrário. Podemos, assim, constatar que, mais recentemente o MP e os tribunais têm sido chamados a assumir uma intervenção que, mesmo quando não sendo de caráter político, tem inevitavelmente resultados políticos determinantes.

Não é de agora - é de sempre - a vocação dos políticos de todos os regimes quando querem endossar suas medidas mais drásticas que desejam usar contra os seus inimigos, transferem as responsabilidades para procuradores e juízes. Isto aconteceu na Alemanha nazista, também durante o estalinismo, em Portugal durante o salazarismo, na Espanha de Franco, no Reino Unido na luta contra o IRA -  o caso verídico do julgamento retratado no filme «Em nome do pai», de Jim Sheridan, ilustra bem tal processo. Geralmente quando é convocada, a Justiça sente-se sensibilizada, fazendo assim o papel que se espera dela.

Os erros começam, quando em nome de determinadas prioridades da política, no nosso caso – quer o MP, quer, em consequência, os tribunais são convocados a integrar as chamadas “força tarefa” lutas contra certos tipos de crime: pode ser a luta contra a droga, contra a corrupção, contra criminalidade digital, contra as redes mafiosas de tráfico de pessoas, etc. Apesar de não percebermos, os problemas e distorções começam a surgir quando as autoridades judiciais e judiciárias começam a passar, sem sentido crítico e o distanciamento indispensável e ao incorporar no seu vocabulário funcional esse tipo de expressão - «a luta contra» - faz, a gente adivinhar que exista um “conluio” ou alinhamento político-institucional.  Acontece, porém, que ao incorporar este tipo de linguagem acaba, muitas vezes, funcionando como argumento para determinar as decisões que, por fim, são tomadas pela Justiça.

O que gostaríamos de abordar é a fragilidade de equilíbrio em que, quase sempre, a Justiça se deixa colocar ante a intervenção da mídia e dos outros poderes institucionais nas suas decisões. Queremos chamar a atenção do leitor que, a expressão: «à justiça o que é da Justiça e à política o que é da política» até na democracia é mais retórica do que de fato. Os juristas – magistrados e advogados – devem, portanto, assumir que o seu papel, mesmo quando dizem o contrário, numa democracia é tão político como nos regimes autoritários. Nas ditaduras o alinhamento político da sua intervenção e das suas decisões são apenas assumido de maneira mais ostensiva. Na democracia, não: isso, geralmente, não é possível.

Como professor de filosofia, gostaria de deixar claro que o primado do Estado de Direito e a consequente divisão dos poderes do Estado, torna tal evidência menos notória. Por isso, exigimos sobretudo dos magistrados, que, mesmo na democracia, adotem uma maior atenção e vigilância críticas sobre o papel que, em cada momento, lhes é solicitadas. 

  

 

 


ARTIGO - A geração que fez a diferença! (Padre Carlos)

A geração que fez a diferença!      Decorridos tantos anos do fim da ditadura, observa-se que a geração da utopia está partindo e a nova...