sexta-feira, 23 de outubro de 2020

Artigo - Um dia fomos jovens (Padre Carlos)

 


Um dia fomos jovens


 

Outro dia estava conversando com minhas filhas que o tempo passa e a gente nem vê. Quando nos damos conta, alguém está levantando no coletivo para você sentar. A vida ensina que os amores são passageiros. Mas os momentos com aquela pessoa são eternos. As amizades são únicas e o verdadeiro amor é imortal.  E a vida, é uma só. Não perca tempo.


Esta viagem inicia-se na minha memória, passa pela renovação dos tempos e encontra-se na continuidade de uma linha temporal que se mantém mesmo no caos.  Só assim, poderei construir o percurso da minha juventude na história recente do país, entre tempos calmos e conflituosos em que vivi. 

E aí ficaram as lembranças de uma Pituba em transição de balneário para bairro de classe média. O sonho de transformar o mundo e ser feliz. Daí a gente passa naquela rua outra vez, faz questão de sentir um gosto de amêndoa ou o cheiro da maresia que nos remeta à infância, conta e reconta as histórias para conhecidos em busca de matar a saudade, nem que seja só um pouquinho.

Não há nada mais gostoso do que relembrar os velhos tempos, “Você lembra, lembra, eu tinha estrelas nos olhos, um jeito de herói, era mais forte e veloz, que qualquer mocinho de cowboy”.

Se eu pudesse, voltar ao passado com certeza, não deixaria passar as oportunidade que perdi e os amigos que desencontrei. Se fosse possível, eu viveria tudo outra vez para matar essa saudade que mora no meu peito e faz com que os dias sejam mais difíceis do que pensei.

Depois de certa idade, não existe nada mais prazeroso que sentar em uma roda de amigos e falar sobre os momentos vividos. Falar sobre aquele amigo da filosofia ou da teologia que sumiu os namoros, paqueras, medos e enrascadas que vivi antes de entrar no seminário. É como se cada um formasse um pedaço da sua vida, como um quebra cabeça e quando todos se juntam você se sente completo. E num instantes, tudo o que passou retorna à sua mente como se tivesse acabado de acontecer.


        A vida é uma eterna nostalgia. Eu, por exemplo, estou sentindo uma saudade imensa dos tempos do grupo de jovens, da CVX, dos anos de formação e da militância política. Meu Deus, como era feliz naquele tempo e como parecia que os dias eram intermináveis.

Um dia fomos jovens, imaturos e cheios de sonhos para dar.

 

 


quarta-feira, 21 de outubro de 2020

ARTIGO - O acolhimento de gays na Igreja ( Padre Carlos )

 


O acolhimento de gays na Igreja

 


Quando lemos alguns jornais no Brasil a respeito dos documentos da Igreja e da preocupação que o Papa vem demostrando em relação à família, percebemos a falta de conhecimento de alguns profissionais da imprensa a respeito dos assuntos relacionados à este Papado e o Vaticano. Para quem vem acompanhando de perto este pontificado, sabe que já havia uma grande expectativa de que o casamento entre pessoas do mesmo sexo fosse abordado durante o sínodo da família, em 2015, mas não houve desenvolvimentos. Na altura, o Vaticano vivia uma “guerra surda” entre as alas conservadora e progressista, onde Francisco se insere. Nessa altura, o Papa afirmou que “não deve haver nenhuma confusão entre a família desejada por Deus e outros tipos de união”.


Penso que é um grande passo que estamos dando para integrar todo o povo de Deus. No passado, até as uniões civis eram olhadas de lado em vários quadrantes da igreja. Ele está colocando toda a sua autoridade e o peso do seu pontificado em favor do reconhecimento legal das uniões entre pessoas do mesmo sexo.

Não podemos esquecer, que quando era arcebispo de Buenos Aires, Francisco opôs-se aos planos do Governo de aprovar o casamento entre pessoas do mesmo sexo, mas mostrou-se favorável a outro tipo de reconhecimento legal. No livro On Heaven and Earth, publicado em 2013, o Papa não rejeitava a possibilidade de reconhecimento de uniões civis, defendia  leis que pudessem proteger e reconhecer de forma legal este casal, como a  uniões estável de homossexuais, para que fossem integrado na sociedade.

As declarações de Francisco podem não marcar uma alteração imediata da doutrina da Igreja Católica em relação ao acolhimento de homossexuais, mas representam uma abertura e uma mudança de mentalidades. O seu antecessor, Bento XVI, descrevia a homossexualidade como um “intrínseco mal moral”.


A posição do Papa foi revelada durante o documentário Francesco, que estreou esta quarta-feira no Festival de Cinema de Roma. O filme incide sobre a forma como o Papa, escolhido em 2013 aborda questões sociais, sobretudo entre aqueles que vivem “nas periferias existenciais”, explica a Catholic News Agency.

“Os homossexuais têm o direito de fazer parte de uma família. Ninguém deve ser deixado de fora ou sentir-se arrasado por causa disso”, afirmou Francisco.

 

 

 

 


ARTIGO - O caso Robinho e a cultura do estupro ( Padre Carlos )

 

O caso Robinho e a cultura do estupro

 


Será que existe uma cultura que influencia o estupro de mulheres aqui mesmo no Brasil? O termo cultura do estupro voltou à tona após a enorme repercussão com as novas informações conseguidas através de uma escuta telefônica.  Este caso de estupro coletivo ocorrido em 22 de janeiro de 2013 teve como protagonista o jogador Robinho com mais cinco brasileiros em Milão. 

 


Nesta última sexta-feira, o "ge" publicou uma reportagem revelando trechos da conversas de Robinho com amigos que estão anexadas neste processo. Mas, o que chocou a população e deixou todos envolvidos ou não com o futebol revoltados, foi o diálogo deste jogador e seus comparsas debochando do caso e confessando que praticou sexo oral com a vítima, além de presenciar o ato sexual de seus amigos e a situação indefesa que se encontrava sua vítima.

Este caso foi fundamental para a gente desmistificar o conceito do estupro e seu algoz. Quando falamos em estupro, vem no nosso imaginário que por trás dessa ação que é quase cinematográfico se encontra sempre um delinquente. É mais fácil imaginar que os praticantes desse crime são monstros, pessoas mentalmente desequilibrada.

Para quem vê de fora, a impunidade seletiva, termina se  assombrando com a forma que estas pessoas se acham acima do bem e do mal . Figuras públicas do futebol costumam ser acolhidas em um véu de tolerância e aparente impunidade. Isto não é só com jogadores, mas com todos aqueles que acham que podem tudo, que o dinheiro e a fama lhes protegem.

Apesar de ter conhecimento do processo que o jogador está respondendo na Itália, o clube só tomou uma posição neste caso quando este escândalo se tornou público. Assim, de forma a contragosto, a agremiação publicou um comunicado suspendendo o vínculo contratual com o jogador. O Santos só tomou esta decisão, porque sofreu pressão de torcedores e até dos patrocinadores, que ameaçaram cancelar seus contratos caso o time se omitisse diante deste caso.


No lugar inalcançável da figura pública, o jogador não pode ser acolhido no silêncio dos compadres da bola. Como poderia justificar suas indiferenças com este caso?  A maioria teve que discordar publicamente da atitude do colega, não escolher o silêncio perante qualquer violência, no nível que seja, é a postura correta para não sedimentar a continuidade dela. Ouvir publicamente o repúdio de um parceiro talvez causasse desconforto, raiva, mas o que é isso perto das marcas no corpo da mulher estuprada pelos sujeitos que acreditavamos ser referencia para a juventude da Vila Belmiro?

 

 

 


terça-feira, 20 de outubro de 2020

ARTIGO - Ciro pode enterrar o legado de Brizola ( Padre Carlos )

 

Ciro pode enterrar o legado de Brizola



Uma das máximas criada por Maquiavel que podemos usar para entender as movimentações e alianças que Ciro Gomes e as forças de direita tem feito no Brasil afora, seria: “O príncipe audaz deve tentar dividir para governar”. Como estamos falando da Idade Média, ele teria dito.“ Dividir para reinar,” já que viveu na era de príncipe e não de presidentes e governadores.


Não há dúvida que o pedetista, pela desenvoltura com que se desloca do trabalhismo à direita, é hoje considerado um às que as forças conservadoras e o mercado têm escondido em sua manga, sem causar maiores frissons na esquerda festiva.

O que não está claro ainda para alguns analistas, é se este comportamento é propositadamente ou não, o certo é que a forma como o ex-ministro de Lula, vem empregando o ensinamento de Maquiavel, entre seus antigos aliados tem intrigado os cientistas políticos. Eles não sabem ainda  como os Gomes conseguirá a proeza de administrar os contrastes entre o capital e o trabalho.

Quando todos esperavam que, com o poder que conseguiu concentrar entre as forças progressistas do país, transformasse as eleições municipais em um grande projeto para as esquerdas, aconteceu o oposto. O que se esperava de um estadista, era que trabalhasse para unir ainda mais as siglas e usasse sua liderança para junto com outros ícones do seu campo, construíssem um projeto coletivo, infielmente o que estamos presenciando é justamente o inverso.

Nós sabemos que a grande fraqueza do nosso povo é quando ele está dividido. O povo dividido se enfraquece, já o povo unido se fortalece. Infelizmente nós estamos numa época de muitas divisões, de dificuldades de entendimentos, e isso vai enfraquecendo as lutas do povo. Nós estamos num estágio em que os brasileiros estão pagando um preço alto por aquilo que o próprio eleitor fez ao longo dos últimos anos e que teve um impacto grande na economia e nas conquistas trabalhistas acumuladas no século passado.


Diante desta realidade, já se comenta nos meios políticos, que as alianças que Ciro tem construído nos últimos tempos, podem levar o PDT e o trabalhismo que Brizola construiu ao longo da sua vida a um desgaste ideológico irreparável, levando como consequência o fim do legado brizolista.

domingo, 18 de outubro de 2020

ARTIGO - A história nunca se repete. (Padre Carlos)

 

A história nunca se repete.

 

 


 

 

Como professor de filosofia, venho me perguntando como o Brasil mudou em menos de uma década e como foi possível tal mudança?  Como tirar uma lição de todos estes acontecimentos? A ideia de que a História se repete tornou-se noção comum entre as pessoas por uma série de razões, dentre as quais se encontra uma visão mutilada da nossa história, marginalizando milhões de indivíduos e, indiretamente, colocando cada um de nós em uma categoria que não é a dos heróis; ou seja, nos leva a pensar, “devemos nos colocar em nosso devido lugar”.

 


Não há dúvida que as histórias passadas e presentes podem apresentar diversas e importantes semelhanças, afinal a sociedade apreende tudo de formas variadas e guarda na memória. Os momentos passados são experiências que podem e devem ser resgatadas e utilizadas a todo e qualquer momento e, nesse sentido, encontramos diversas semelhanças em variados momentos da história das sociedades. Será mesmo que a história se repete? Uma das frases mais repetidas de Karl Marx é de que a história se repetea primeira vez como tragédia e a segunda, como farsa (O 18 Brumário de Louis Bonaparte) ficou no nosso imaginário e passou a ser uma verdade absoluta no meio acadêmico. Muito se disse também que Bolsonaro repete os métodos de Adolf Hitler, assim não seria de se estranhar as semelhanças e os projetos. A tragédia seria o governo de Hitler e a farsa, o do Bolsonaro.



As tragédias e as farsas, sempre trazem consigo as vítimas estampadas nos seus rostos. Além disso, percebemos que os acontecimentos que levaram a ultradireita ao poder no Brasil, esta mais relacionados à história social do que a individual.  Praticamente todos os analistas político e historiadores, concordam que foi Rohn um dos maiores responsáveis pela ascensão política de Hitler, fazendo com os grupos dos camisas pardas, que organizou a partir dos anos 30, as SA (Sturmabteilung) o trabalho sujo de solapamento da débil democracia alemã.  Assim, podemos afirmar que a atuação da Lava Jato teve um papel semelhante, mas não teria surtido o efeito que teve se não tivesse o apoio e a omissão de parcela do estado brasileiro, através das suas instituições. Elas foram as grandes responsáveis pela chegada de Bolsonaro à presidência e para isto foi necessário uma “força tarefa” com o” Supremo e tudo” para tirar o candidato da esquerda do pleito eleitoral.

 A máquina pública que o Partido dos Trabalhadores foi acusado de ter aparelhado foi à mesma que apeou Dilma do poder, A estrutura burguesa que se escondeu sobre o manto do Estado brasileiro tentou por anos, derrubar este governo que se elegeu de forma democrática, até conseguir fazê-lo em 2016. Um movimento político que, três anos depois, culminou com a subida ao poder de Jair Bolsonaro. O atual Presidente dizia durante a campanha, que o PT tinha “aparelhado o governo”, agora que a mascara vai caindo, podemos constatar como a direita controlava o Estado e como este projeto de governo estava atrelado ao aparelhamento que a burguesia impôs as instituições e ao conjunto do Estado brasileiro. Só diante de todas estas evencias este governo vai dando mostras, porém, de que é ele quem vai realizar um dos maiores aparelhamentos do Estado já vistos na nossa história.


O que aconteceu no Brasil nestes últimos anos reforça cada vez mais a tese que as teorias liberais iluministas do século XVIII, precisam ser colocada em pratica por uma reforma urgente. Precisamos exigir a reorganização do Estado. Montesquieu foi um dos pensadores que mais escreveu sobre a organização do Estado, pressupondo a tripartição do poder, Executivo, Legislativo e Judicial (ou judiciário), que deveriam ser independentes entre si, cada um com uma função específica, teoricamente harmônica para o funcionamento do Estado.


        Quase 100 anos depois da ascensão do nazismo na Alemanha, aqui no Brasil os métodos são outros, mais civilizados. Por isso os interesses de classe e de frações de classe podem se preservar por muito tempo, séculos; apesar de poderem se manifestar de maneiras variadas.



sábado, 17 de outubro de 2020

ARTIGO - O movimento estudantil da transição (1974-1984). (Padre Carlos)

O movimento estudantil da transição  

(1974-1984). 

 



 

Hoje eu estava pensando naquela juventude que participou do movimento estudantil no final da década de setenta e uma questão que me chama atenção é o saudosismo que temos dessa época, como se não existisse mais essa mobilização. Assim, gostaria de prestar uma homenagem aquela geração e resgatar a memórias dos militantes estudantis que viveram aquelas páginas da nossa história   e militaram no período da transição democrática brasileira (1974-1984). 

Quero aqui focar neste período de transição democrática, por ter sido o nascedouro das nossas lideranças de esquerda e que de certa forma estão partindo desta vida. Como disse São Paulo: “Combati o bom combate, terminei a corrida, guardei a fé”. É preciso lembrar, que a primeira geração do movimento, dos anos 60, pode ser considerada derrotada pela própria rigidez do período militar, pela repressão e a adesão a luta armada. Já a geração do final dos anos 70 foi gloriosa por acelerar o processo de democracia no país. Na época, os movimentos, sindicatos e representantes da sociedade estavam parados em função da repressão. Foi justamente este movimento um dos primeiros a se mobilizar pela liberdade democrática. Reivindicações por melhorias no transporte, preços mais baixos nas refeições universitárias e aumento nas verbas foram algumas lutas travadas pelos estudantes. 

Poderia afirmar que a diferença do movimento estudantil de hoje para a do período em que militamos, é um caso de gerações. O movimento de lá foi fruto de um intervalo que existiu por conta da intensa repressão militar. Aqueles estudantes eram muito mobilizados por conta do tempo que estiveram parados. O movimento atual é fruto da década de 90 e nasceu em um período de democracia, não vivendo, portanto, em períodos de repressões. Isso fornece uma formação com outra postura social, mas também representam uma época. 

Se tinha um grupo dentro da universidade que sabia fazer uma festa era os jovens da tendência Liberdade e Luta. Isto se deve a característica da Libelu é que, entre todas as tendências da luta estudantil em ação no final da ditadura militar, ela foi a que mais encarnou a ideia de que “é proibido proibir”. Era possível ser Libelu e ser e provar de tudo, estas atitudes para as quais parte da militância de esquerda ainda torcia o nariz naquela época como “desvios burgueses”. Quanto a mim que fazia parte de um grupo da Igreja Católica ligado aos jesuítas do CEAS, era um choque cultural tudo aquilo. Mas com o tempo, você termina entendendo aquelas pessoas. 

Eu gostaria aqui de fazer justiça aqueles meninos, a face “esquerda festiva” do grupo, famoso por organizar as baladas mais animadas do movimento estudantil, o lado “liberdade”, não poderia aqui ofuscar a parte da “luta” propriamente dita. A Libelu ganhou destaque por assumir nas ruas o slogan Abaixo a Ditadura antes de todo mundo, mesmo correndo o risco de ser alvo dos órgãos de repressão. 


Memória e História do Tempo Presente possuem relações bem estreitas, em especial, pelas lembranças e história de vida de muitos brasileiros. Este potencial da memória de uma geração, suscita o nosso testemunho como fonte e pedaços da nossa vida. Surge, assim, um desafio, que consiste em relacionar presente e passado dentro de mim, estabelecendo as definições de tempo de um passado recente que não podemos esquecer. O passado precisa ser sentido tanto como parte do presente quanto separado dele. Nossas memórias deveriam interessar aos historiadores do tempo presente por apontar uma página escrita com muito suor desses meninos. Não podemos esquecer, que a memória em seu sentido essencial da palavra é a presença do passado.  

ARTIGO - A geração que fez a diferença! (Padre Carlos)

A geração que fez a diferença!      Decorridos tantos anos do fim da ditadura, observa-se que a geração da utopia está partindo e a nova...