Nosso
Deus não tem máscara
Outro
dia uma jovem me parou na rua: "Padre Carlos não se lembra de mim? O
senhor até me batizou..." E eu: "Puxa um pouquinho a máscara", e
ela puxou. "Como você cresceu!"
Se
alguém falasse há algum tempo atrás, que um dia haveríamos todos de andar de
máscara, eu não acreditaria! Eu sei que havia e ainda há muita gente mascarada,
mas estas máscaras são outras... Agora, foi imposto o uso da máscara para
todos, por causa da gente e dos outros: para que todos fiquem protegidos, ao
mesmo tempo não ficamos protegidos, porque ficamos sem a presença dos outros.
Como faz falta está cara a cara, falar cara a cara, tocarmo-nos, sorrir, rir,
está com os sentidos todos alerta na presença viva dos outros. Passámos a vida
toda dizendo para nossos filhos: "Dá um beijo no vovô, um beijo na vovó,
um beijo na titia...”.
Agora,
de repente, é tudo ao contrário, como se os outros fossem inimigos, pois até
viramos as costas... Apertávamos as mãos, porque apertar as mãos é um gesto de
encontro da paz: as mãos livres de armas vão ao encontro do outro, sem medo.
Antes desta pandemia, abraçávamos o irmão nas celebrações ou no dia-a-dia com
alegria pelo reencontro ou chorando pelo luto ou antecipando a saudade pela
despedida. Agora, não pode haver mais proximidade, o tal protocolo manda que mantemos
certa distância, uns dos outros. Mas o que eu espero mesmo, no fundo do meu
coração é que seja só a distância física, espero que a outra - a espiritual, a
afetiva - se mantenha próxima e aprofunde cada vez mais.
Foi
preciso uma pandemia para tornar a afirmação de Sartre inválida: "O
inferno são os outros." No entanto descobrimos que na verdade é o contrário:
a falta dos outros na minha vida é que é o inferno, a solidão é um inferno
neste confinamento.
Não
é só, mas também, pela ausência ou pela perda das quase 200 mil mortes que
passamos a tomar consciência do valor das coisas e das pessoas na nossa vida.
Vocês não sabem a falta que fazem na minha rotina! Só quando alguém morre é que
percebemos a importância e o valor dessa pessoa na nossa existência e a falta
que nos faz o Natal, o Réveillon que diziam que já estaríamos no novo normal!
Mas essa falta também pode e deve ser uma oportunidade para iniciar com um ano
melhor, mais verdadeiro, mais autêntico, mais íntimo, mais solidário. Afinal,
buscamos na correria própria destas festas, das compras e esquecemos o
verdadeiro e essencial!
E o que é o essencial? Talvez já
tivéssemos esquecido, mas o Natal é, antes de qualquer coisa, a
celebração deste acontecimento determinante da história: o nascimento
de Jesus.
Que o
espírito do Natal e do Ano Novo, ilumine a humanidade, mas que não esqueçamos
que o amor é o verbo divino.