sábado, 22 de fevereiro de 2020

Artigo - Uma sobrevivente de Auschwitz (Padre Carlos)




Uma sobrevivente de Auschwitz





Durante muitos anos, a preocupação dos teóricos de esquerda era criar as condições no campo ideológico para que este pensamento pudesse ser a base utópica das novas gerações. Desta forma, estes pensadores achavam que todos os horrores vividos no século passado não permitiriam que valores fascistas pudessem ser resgatados pelas novas gerações. Estes pensadores de vertentes progressistas esqueceram-se de certos ensinamentos: A história se repete, a primeira vez como tragédia e a segunda como farsa. Por que a história se repete, por que está acontecendo tudo de novo?
        
Uma sobrevivente de Auschwitz, Esther Bejarano, chama a atenção do mundo sobre a escalada destas forças nos últimos tempos. Além de recordar a sua história, Esther, hoje com 95 anos, e com a lucidez que a perspectiva lhe permite, é enfática: “está tudo acontecendo outra vez”. E como está.
É como se nossa memória coletiva começasse esquecer os horrores do Nazifacismo e por ingenuidade ou ignorância, achasse que estes regimes não fossem mais defendidos pelas novas gerações e suas idéias pertencessem apenas aos filmes antigos de Hollywood ou aos livros de história. Parecia distantes para estes pensadores. Parece que acordamos de um sono profundo, ficamos surpreendidos nos últimos anos com o surgimento desta praga. Assim, passamos a presenciar a imprensa tolerando o discurso do ódio racial sob determinados pretextos, que vão desde o da liberdade de expressão à importância da diversidade de correntes de pensamento, passando por falta de decoro ou postura ética.
Já ganharam eleições na Europa e nos Estados Unidos e no Brasil, com promessas de expulsão da oposição, estrangeiros e de construção de muros para que não voltem a entrar. Já se separam crianças latino-americanas dos pais nas fronteiras de países como os Estados Unidos e se detém cada uma em sua cela com acusações de imigração ilegal. Aqui no Brasil, a extrema-direita já chegou ao poder e até em partidos de centro surgem vozes, da ribalta, que se permitem proferir os maiores ataques a classe trabalhadora e aos pobres.
Nunca tive a oportunidade de visitar Auschwitz, onde Esther esteve presa. Mas, não tenho dúvidas em afirmar que, pelo simbolismo que tem, continua sendo um dos locais mais importantes do mundo e o museu em que foi transformado devia ser preservado para sempre. Os governos deviam tornar obrigatório o estudo sobre os males causados a humanidade por estes regimes, para que a nova geração não se encantasse o canto da sereia por falta de informação.
Como diz o poeta: “E há que se cuidar do broto, pra que a vida nos dê flor, flor e fruto”. Para que esta não desapareça e dê lugar ao vazio. Para que não se fertilize o terreno onde floresce o discurso do ódio racial.
Certa vez, um amigo me falou que em Birkenau, o campo de extermínio pertencente ao complexo de Auschwitz, jaz uma lápide precisamente no sítio onde antes funcionaram as câmaras de gás e onde se lê: “Permita-se que este local, onde os nazis assassinaram cerca de um milhão e meio de pessoas, homens, mulheres, crianças, sobretudo judeus, de vários países da Europa, seja um grito de desespero e um sinal de alerta para a humanidade”.
Esther Bejarano me falou todas estas coisas. Agradeço o amigo que fez chegar este artigo em minhas mãos. Gostaríamos que nesta quaresma, pudéssemos refletir sobre as suas palavras e sobre a sua memória. E como disse Marx, a história se repete, mas é nossa obrigação mudar o seu rumo para proteger as vítimas desta besta.
Padre Carlos


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