Ciro e o coronelismo moderno
O último acontecimento ocorrido na cidade de
Sobral no Ceará chama atenção de toda a nação para dois comportamentos inaceitável
em um Estado Democrático. O primeiro tem haver com o comportamento das
lideranças da Polícia Militar local. O segundo com a atitude do Senador Cid
Gomes e a forma como esta liderança tentou acabar com o motim da Polícia do “seu”
Estado. Não estou querendo com este artigo justificar o comportamento miliciano
dos policias cearense neste episódio. Nosso objetivo é avaliar a atitude de um
Senador da República em um conflito local.
Não somos críticos à esquerda e não estamos
acusando a Família Ferreira Gomes de ser representante do “coronelismo” do Estado
do Ceará. Mas, quando um clã passa a ocupar diversos cargos políticos em uma
determinada região, termina chamando a atenção dos cientistas políticos seja de
direita ou de esquerda. Ciro foi Governador, seu irmão Cid Gomes também, e seu
outro irmão Ivo Gomes é Prefeito de Sobral, cidade de origem e reduto eleitoral
dos Ferreira Gomes. Além disso, o Governador até 2022, Camilo Santana, foi
eleito com o apoio de Ciro, bem como o Prefeito de Fortaleza até 2020, Roberto
Cláudio. Por outro lado, não podemos negar que o voto é centro vital de todo o
sistema coronelista e que a influência dos coronéis está no seu poder de mando,
de coerção junto à população local. É desta forma que a família Ferreira Gomes,
mantém sua força, ou seja, o voto. No entanto, gostaria de chamar a atenção do leitor,
que a base de sustentação do coronelismo está na sua estrutura poder,
fornecendo subsídios necessários para as outras forças que possa compor a nível
nacional.
Quando presenciamos Ciro Gomes criando um
show em matéria de direito constitucional e dizendo, hora que Lula é inocente, hora
que é culpado; entendemos os verdadeiros motivos. O papel do coronel não
necessariamente deve ser daquele que possui bem capital ou terras, podendo ser
uma pessoa que possua ensino superior, já que esta prática se difunde muito no
Brasil, formando advogados e médico e criando uma cultura que distancia o povo
das elites. Nesta, encontramos a defesa da formação acadêmica para ocupar posições de
mando, que política é pra gente rica e que existem famílias na elite local que
defende o pobre e podem fazer o confronto com o coronel da Primeira República.
Mas de onde vem esta
tradição política da família Ferreira Gomes? Podemos afirmar que
esta vocação foi herdada do pai deles, José Euclides Ferreira Gomes, que foi
Prefeito de Sobral na passagem dos anos 1970/80. José Euclides era um funcionário público e não
um coronel proprietário de terras, ou outro meio que lhe desse a proeminência
social característica do coronelismo. Apesar de uma brilhante carreira, podemos
avaliar esta trajetória de sucesso desta família, com novos elementos da
ciência política para tentar entender como e quando surge este projeto político
e como chegaram de fato ao poder em seu estado.
Seria possível caracterizar Ciro e a Família Ferreira Gomes como
representantes de um suposto “coronelismo moderno”? É preciso analisar esta trajetória e as
propostas políticas defendidas por eles.
Pode-se concordar ou
não com o projeto que Ciro Gomes
vem apresentando nos últimos anos, como alternativa
para o Brasil, no entanto, é preciso analisar corretamente o significado de sua
biografia, sua participação como gestor público, e as idéias que defende, para
julgá-lo pelo que realmente é, ainda que sua guinada para o centro, abandonando
a esquerda, tenha arranhado seus prestígios e alimentado uma divisão dentro
deste campo, não podemos negar sua importância no plano nacional. Este
comportamento dos Ferreira Gomes, apontam para um novo fenômeno na cena política brasileira: uma parcela
significante da esquerda está se deslocando para o centro. Parece paradoxal, e
é; trata-se de uma tendência pela adesão a itens da pauta conservadora, com o
intuito pragmático de conquistar os setores das classes médias que se opõem a
forma de governar e a falta de postura ética do bolsonarismo.
Para se opor, mas não
com base em preconceitos, mas com conceitos da filosofia política, podemos
afirmar que sabíamos o tempo todo que se tratava de um coronelismo moderno com característica
semelhante do que surgiu, na região da baixada fluminense, mais especificamente
no município de Duque de Caxias no período compreendido entre 1952 e 1964, a
partir da construção da figura mítica de Tenório Cavalcante, conhecido como o
Homem da Capa Preta. Assim Ciro, com um programa
claramente desenvolvimentista, focado na industrialização, ampliação dos
direitos sociais, distribuição de renda e modernização da educação pública
encantou uma esquerda que achava que tinha desaparecido com o golpe de 64.
Leonel Brizola do PDT foi um dos maiores entusiastas da candidatura de Ciro,
apoiando-o em 2002. Brizola se aproximou de Ciro pela afinidade histórica com a
tradição nacional-desenvolvimentista e trabalhista representada por Getúlio
Vargas e João Goulart: na campanha de 2002 a coligação de Ciro com o PDT de
Brizola chamava-se “Frente Trabalhista” usados de forma
distorcida como meros adjetivos não-históricos.
Assim, acredito que
ao subir naquela retro escavadeira e tentava furar um bloqueio feito
por policiais no 3º Batalhão da Polícia Militar do município, o Senador carrega
um simbolismo de está disposto a lutar e dar a vida se for preciso pelo povo,
mas o povo não pode fazer sozinho, precisa da elite local que esta do seu lado.
Como disse Bertolt Brecht Miserável país aquele que não
tem heróis. Miserável país aquele que precisa de heróis.
Padre
Carlos
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