segunda-feira, 15 de novembro de 2021

ARTIGO - Nossa República e seu défice democrático (Padre Carlos)

Nossa República e seu défice democrático

 


 

O legado das lutas emancipatórias na América Latina é um ótimo lugar para iniciar um relato das origens da idéia de resistência e as atuais lutas que se travam neste continente. Mas, embora a natureza dessa relação esteja longe de ser tão claro quanto isso, a herança da luta contra os colonizadores é clara no Novo Continente, atingindo o seu apogeu na idéia de Democracia.


Apesar de todas as suas imperfeições, a democracia ateniense pautou e acompanhou grande parte do desenvolvimento da civilização ocidental até aos dias de hoje, tornando a Europa no berço da democracia moderna e a América Latina e a África, como colônias sem direito ao conceito de liberdade. A conquista da independência até o caminho que levou o povo ameríndio e os descendentes de escravos terem direito ao voto não foi linear e não faltaram revoltas por estas idéias de igualdade.

Até o início do século passado, as minorias letradas pautavam as vidas da restante população predominantemente analfabeta. As elites era o completo oposto da idéia de equilíbrio e, apesar das revoltas como aconteceu no Brasil como a do Forte de Copacabana e da Coluna Prestes, só em 1930, o povo despertou. Por breves instantes, houve esperança. No entanto, os filhos da revolução voltaram a cair e, embora a História nunca se repita, pudemos constatar do Norte ao Sul um aggiornamento da onda azul nos EUA do partido democrata ao outro hemisfério com uma “onda vermelha” na América Latina, esta sim com reais possibilidades de se concretizar.

Além dos governos de caráter revolucionário, como  a da Venezuela que segue com um governo central sob Maduro, assim como Cuba e Nicarágua, mesmo com as perdas dos sonhos da sua revolução, teve também a Argentina, que desbancou a política neoliberal, elegendo um governo com votos populares.

A Bolívia voltou a pertencer a seu povo e os “cocaleiros”, através de Lucho Arce. O Equador, após a fim do governo de Rafael Correia, perseguido pelas elites, à esquerda apesar de não ter ganhado as eleições, deixou claro que tem força para voltar ao poder.

O México também está com a esquerda, desde as últimas eleições. O Peru e a Colômbia, também estão com uma esquerda com mais chance de sucesso, nas próximas eleições e a articulação entre os países e seus povos, favorecem este cenário.

A relação entre promessas e realidade, não podem ocupar um discurso populista para seguir ocupando o espaço político, seja à esquerda ou à direita e com a perda relativa do protagonismo internacional e uma  política externa de menor intensidade nos governos Temer e Bolsonaro ficam evidentes cada vez mais a importância que o Brasil deve ocupar no cenário internacional.

Mas o caminho do projeto de integração latino americana não será fácil, desde as crises políticas as quartelas e os golpes das elites econômicas.  Apesar dos avanços democráticos, não podemos negar que a democracia latina americana atravessa uma fase verdadeiramente difícil, fruto de respostas fracas e hipócritas a problemas internos e de política externa por parte das suas instituições. A confiança dos latinos nos seus sistemas de governo tem-se deteriorado e alguns povos confiam cada vez menos nos seus governantes, tendo isso ficado bem patente nas últimas eleições. A descrença aumentou um pouco por todo o Novo Continente e a comunicação política transformou-se em algo enredado e confuso.

Num meio em que a corrupção se tem tornado progressivamente numa realidade, a abnegação dos jovens face à política é cada vez mais preocupante. Hoje em dia, o voto é o bem mais precioso que este povo tem para se libertar e, depois de tanto tempo convivendo sob as conseqüências nefastas de uma pandemia, os cidadãos voltam-se para os seus líderes e instituições à procura de soluções. Depois de quase dois anos extremamente penoso para muitos, podemos constatar a falta que faz uma liderança capaz de conduzir com habilidade política, as lutas e projetos para construção da soberania não só do Brasil, mas de toda a América Latina.

 


Vivemos tempos imagináveis. Como Churchill afirmou, a democracia é a pior forma de governo, à exceção de todas as outras. Numa época em que a democracia atravessa um claro défice democrático, é necessário olhar criticamente para o processo democrático e confiar no mesmo, mas, para isso, é imperativo que a América Latina esteja bem articulada.  Esperemos que todos contribuam devidamente para as novas e complicadas etapas que se interpõem no caminho do projeto latino americano.


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