Sobrevivendo a duas Pandemias
Estamos vivendo tempos difíceis e
esta quadra da história se apresenta para os Brasileiros como um marco entre barbárie e a civilidade. Em todos os recantos do país, recrudescem fatos
que deixam à mostra a intransigência. Estamos evidenciados, que não é só o covid-19
que se propagou pelo Brasil, outro vírus e mais letal que este tem infectado as
pessoas. Assim como o coronavírus, podemos afirmar que a intolerância tem se
apresentado como uma espécie de pandemia global. Por meio dessa infecção da
alma, os doentes seguem dispersando o vírus, cujos sinais e sintomas mais
comuns são o discurso do ódio, os atos de violência e a tentativa de acabar com
o Estado de Direito e a democracia.
Agora os infectados ultrapassaram todos os limites da loucura, ignorando as mortes causadas pelo coronavírus no Brasil e invadindo UTIs para verificar se os leitos estão realmente ocupados.
Quando o vírus da intolerância chega a este estágio de constranger os
pacientes e colocar a vida dos visitantes em risco, alguma coisa está errada.
As nossas autoridades parecem que já
se acostumaram com ataques aos poderes da República, as agressões aos povos indígenas,
a esquerda, aos negros e aos pobres, entre outros. Esses são alguns exemplos
que trazem à luz a conjuntura de intolerância. É certo que a intolerância não é
um mal da humanidade contemporânea. A história registra fatos que realçam a
intolerância em todas as épocas da humanidade. Apesar dos brasileiros
assistirem com certa apatia a estes episódios políticos, religiosos e sociais,
a discussão sobre a pandemia da intolerância carece de reflexão por parte dos
nossos políticos e uma vacina para sua cura o mais rápido possível.
A exemplo do covid-19, com suas
infecções virais, a pandemia da intolerância vai se instalando sorrateira e
silenciosamente nas Instituições da República. Ao se dispersar na tessitura da
alma, o vírus da pandemia da intolerância alcança as dimensões mais profundas
do Estado, tentando se instalar pela alteração da capacidade racional das suas
maiores autoridades. Os doentes da alma, vítimas da pandemia da intolerância,
usam argumentos supostamente racionais para difundirem a enfermidade de que são
portadores à sociedade. A intolerância se mascara sob o discurso de caça aos
corruptos, dos “bons costumes” e da “moral
cristã”.
Infelizmente, à semelhança com o
coronavírus faz com que o enfermo da pandemia da intolerância não tenha
consciência do mal que carrega em si e que ele mesmo dissemina com suas
práticas e discursos cotidianos. Há doentes que sequer têm consciência da
doença.
Para os enfermos desta pandemia, qual
seria o mundo ideal? Talvez um mundo sem negros? Talvez um mundo sem pobres?
Talvez um mundo sem homossexuais, sem pessoas transgêneros ou travestis? Talvez
um mundo cuja família tradicional fosse o único arranjo possível? Talvez um
mundo com apenas evangélicos, uma nova cristandade? Talvez um mundo marcado por
governos teocráticos? Talvez um mundo em que a mulher seguisse ocupando
posições de subalternidade em relação aos homens?
Esse mundo – moldado nos valores que
estes enfermos defendem, alicerçado, inclusive, no dogma do anti-PT, ou na
falsa moral que determina padrões que devem ser rigidamente impostos e seguidos
por todos e todas – é um mundo que não existe! Aliás, é um mundo que nunca
existiu, nem nas sociedades que estiveram sob o jugo dos regimes totalitários
ou de exceção.
A marca da humanidade não é a
homogeneidade. Em nenhuma sociedade humana a homogenia esteve presente. A
existência da humanidade se alicerça na diversidade.
Os enfermos da alma, vítimas da pandemia
da intolerância, desejam, a qualquer custo, implantar uma sociedade uniforme,
na qual (talvez) todos fossem brancos, “normais”, ricos, heterossexuais e
seguidores de uma mesma religião ou crença. Aliás, será que nesta sociedade
haveria espaço para as mulheres?
Basta estudar um pouco de
história para tirar lições do passado e lembrar que as consequências das
tentativas de se formar uma sociedade homogênea levou a humanidade cometer as maiores atrocidades e ao Nazismo.
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