O remédio é uma overdose de
Utopia
Estes dias recebi uma ligação de um amigo que estava assustado com
tudo que está acontecendo no país. Naquele momento entendi que não era só as
pessoas infectadas que estavam enfermas, toda a sociedade se encontra doente, não
só em decorrência das doenças, mas de uma neurose coletiva, fruto do perigo
iminente este vírus letal e da falta de esperança no futuro. O pior disto tudo,
é diagnosticar estes problemas e não ser capaz de encontrar um remédio que
possa curá-la, da angustia de não haver um amanhã.
Quando ouvir o depoimento de um paciente que tinha se recuperado
do covid-19, dizendo que a sensação era que estava morrendo afogado no seco, entendi
que a sociedade não poderia viver sem utopia e que esta era o ar que ela
respira. A sociedade está sem esperança,
fruto da falta de visão das pessoas. Pior, a desesperança se agiganta, pois não
há mais nada em que se possa sustentar. Mas, diante de todo este medo, mesmo
enlouquecida, fruto da insanidade das pessoas, o milagre acontece. Passamos a enxergar
uma luz no fim do túnel e acreditamos que ainda existe um pouco de bom senso,
algumas vozes se levantam pelo direito da vida, pela sobrevivência de todos.
Esta patologia da sociedade está relacionada a prevalência do
indivíduo sobre o coletivo. Assim, para buscarmos sua cura, ela tem que ter
menos importância e passar a se preocupar mais com o desperdício sobre o
comedimento, do ter sobre o ser, do insulto sobre o respeito, enfim, do eu
sobre todos, depois de muito tempo poderemos criar as condições necessária para
que estes antigos valores deixem de ser a regra central da vida, pela qual as
pessoas hoje se guiam.
A liberdade, a vontade, o desejo, o prazer, tudo em nível
individual perde o sentido quando você não tem para quem exibi-lo, o deus
glutão depois do pós-guerra passa a perder sua força.
Estamos neste momento travando uma luta. A ignorância tenta
oprimir a sabedoria, a força querendo superar o direito, a feiura buscando
enterra a beleza, a violência querendo impor o terror, o demônio sonhando em
vencer a deus. Por todos os lados ouvem-se gritos dos que ordenam, mas já não
se ouve tantos lamentos porque estão começando a desobedecerem, por todos os
lugares as maldades perdem força e já não eclodem mais, como se via antes desta
pandemia. Os negros, os pobres os
honestos e inocentes não se apequenam mais e buscam diante do direito de existir
superar a impotência de reagirem.
Os sintomas da doença que a sociedade contraiu são os seguintes:
o passado é apagado, o presente é esquecido, o futuro é descartado. A história
é desaprendida, a vida é jogada, o amanhã é incerto. O descompromisso é permanente,
o trabalho é temporário, o resultado é indiferente. A riqueza é exaltada, a
pobreza é condenada. O rico é bajulado, o pobre é espezinhado. O jovem é enaltecido,
o velho é desprezado e condenado a se expor ao vírus.
A sociedade pós-moderna é líquida, já diz a sociologia e o que
podemos espera da sociedade pós-pandemia? A crise sanitária, fez com que as
pessoas ficassem sem rumo, como um barco à deriva num mar de tempestade. Aí,
fico aqui a pensar com meus botões: o que será das futuras gerações se não
buscarmos uma utopia que possa curá-la de seus demônios e males.
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