"Ah, não há saudades mais dolorosas do que as das coisas que nunca
foram!"
Apesar
de muitos acharem que a palavra saudade é exclusiva da língua portuguesa, não é
verdade. A diferença, quando falamos em saudade, é
que, na língua portuguesa, a palavra ganhou outros sentidos relacionados à
nostalgia. Entendemos a saudade como um sentimento
nostálgico que vai além do lar. Podemos ter saudade de pessoas, animais,
épocas, lugares, relacionamentos, gostos, cheiros etc. Por isto, costumamos dizer que ‘Saudade’ é uma
palavra apenas nossa difícil de explicar exatamente a um estrangeiro, algo
nostálgica, associada a lembranças de um passado feliz ou de alguém que nos marcou
profundamente.
É algo muito forte, capaz de
modificar os nossos planos, que mexe com os nossos sentimentos podendo influenciar
as opções que tomamos ao longo da nossa vida.
A história que vou partilhar hoje é um bom
exemplo desse sentimento. No final da década de setenta, eu sei, já tem um
tempinho, dois jovens militantes operários que abara de sair do SENAI, de
Salvador, encantados com as greves do ABC, partiram para São Paulo à procura de
melhores condições de trabalho.
Um deles teve uma excelente
adaptação, conseguindo um bom emprego na Volkswagen do Brasil, integrando-se no meio sindical e operário sem
problemas, progredindo na carreira, como não era possível na Bahia. Bem cedo
ficou fascinado com as novas tecnologias e com a forma de trabalhar dos alemães
– e por lá foi ficando, sem vontade de regressar a Bahia.
O outro, pelo contrário, teve
mais dificuldades. Dia após dia ia sentindo a falta de tudo, daquilo que aqui
deixara, da sua terrinha, das suas raízes, da família, dos amigos e do seu estilo
de vida da sua, baianidade nagô.
Esta nostalgia foi aumentando
sempre, de tal modo que, numa das praças de São Bernardo – que tinha de atravessar
a pé a caminho da fabrica – lembrou-se de casa e da mãe! A tristeza apoderou-se
dele, o trabalho não compensava e o desânimo obrigou-o a regressar.
Dito de outra forma, no
primeiro caso prevaleceu à razão, no segundo foi à saudade que falou mais alto.
Nos dias de hoje, não sei se
a história acabaria assim. Os tempos mudaram e a sociedade vai aos poucos impondo
outras regras às quais temos que nos adaptar, com mais ou menos dificuldade.
Esta palavra ‘saudade’, para alguns, pode mesmo não fazer sentido – e aqueles
que ainda a invocam podem ser considerados ‘saudosistas’ por uns e até ‘piegas’
por outros.
A solidariedade deu lugar à
competitividade sem limites e as convicções às conveniências.
A vida resume-se o aqui e
agora – e o que passou a contar é o meu bem-estar, a minha realização
profissional e os meus projetos.
Não me admira que o número de
casamentos tenha caído, enquanto os números de separação sejam cada vez maiores.
Para um jovem, sair de casa e ganhar o mundo é hoje uma coisa natural.
Constituir família não é prioritário – e deixar as suas raízes não tem qualquer
importância. Os jovens de hoje não sabem o que é utopia, se dedicar a militância
e ao partido, estão mais preocupado com o planeta, com o meio ambiente, com as
reciclagens e com a gestão correta dos bens naturais, o que não se via na minha
geração.
Contudo, as boas recordações
não desaparecem, ficam para sempre e devem ser lembradas com a saudade
indestrutível dos momentos felizes da nossa vida.
Saudade continuará a ser a ‘palavra
amarga e doce, estrangulada na garganta, palavra como se fosse, o silêncio que
se canta’. E permanecerá sempre viva nos nossos corações, até ao final dos
tempos. Como diz o poema, português no qual me revejo: ‘Sete letras de
encanto/Sete letras por enquanto/Enquanto a gente for viva’.
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