sexta-feira, 27 de setembro de 2019

ARTIGO - Um ano sem Zélia (Padre Carlos)



Quem é semente não morre! 
 Um ano sem Zélia



  Tem pessoas que se torna parte da nossa vida, amigos que marcam com seu carinho, dedicação que nem a morte consegue apagar a lembrança, por isto nunca nos deixam por completo. E hoje minha amiga, recordo o aniversário do seu falecimento, quero lembrar como você foi importante para sua geração e seus amigos. 
Na verdade, gostaria mesmo era de resgatar sua memória, para que servisse de exemplo para as novas gerações, tão carente de referência tanto moral quanto espiritual. Falar desta mulher é lembrar sua luta por um Humanismo como expressão do Sagrado.
Havia uma fazenda no município de Vitória da Conquista, chamada de barriguda, foi ali que nasceu Zélia. Alegre descontraída, mas com uma personalidade forte, diferenciando-se das demais meninas da sua época. Como diz o poeta: "Descansar morrer de sono na sombra da barriguda". Nossa amiga não se enquadrava em nenhuma sugestão do trovador. Não buscava sombra em homem algum, buscava um companheiro e não queria descansar, queria ganhar asas. 
O arquétipo da normalista que estuda para educar os filhos não se encaixava na sua personalidade e desta forma se torna a primeira mulher de Vitória da Conquista a formar-se em medicina. A voz de Zélia passa agora a ser ecoada de forma forte, longe de sua terra, agora sua arena será na nova capital. Sua luta ganha corpo e alma e engajando-se na luta por transformações estruturais em toda a sociedade. De forma direta e indireta, a ousadia e o pioneirismo em diversas frente repercutiu a experiência, a força e a criatividade desta mulher que, dentro e à frente do seu tempo, percorreu os dias transformando o mundo, do despertar do dia até a hora de dormir.
Quando a utopia é o combustível que nos impulsiona para vida, não existe fronteira para os nossos sonhos.   Sua luta conta a ditadura militar se mistura com outas frentes entre elas podemos destacar o resgate da dignidade de homens e mulheres que eram submetidos a condições sub-humanas, perdiam o direito à cidadania e eram amontoados em hospitais superlotados que usavam de tratamentos violentos que, muitas vezes, resultavam em morte – os cadáveres eram vendidos para laboratórios de anatomia de universidades. Há registros de pelo menos 60 mil mortes entre homens, mulheres e crianças em hospitais psiquiátricos brasileiros. É esta a luta dedicada a pessoas com transtornos mentais que recebiam tratamento considerado absurdo e obscuro dentro de hospitais psiquiátricos brasileiros que ela dedicou boa parte da sua vida. Assim, Zélia se levanta contra toda esta barbárie e torna-se uma das pioneiras da Reforma antimanicomial no Brasil. 
A minha boa e grande amiga não está mais aqui, hoje faz um ano da sua despedida tudo se transformou em algo mais cinzento. Você com sua experiência dos anos vividos, sempre tinha uma palavra de conforto para com os companheiros de luta. Parece até que o mundo perdeu aquela esperança que você trazia no coração. E nesta época em que o fascismo se encontra no planalto, fica ainda mais triste; será o primeiro ano sem a minha amiga!

Zélia sempre foi pra mim referência de amizade e companheira da Teologia da Libertação e é claro, uma grande humanista. Uma verdadeira cristã!

Zélia Serra?

-Presente!!!!!

Padre Carlos



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