Um ilustre visitante
Não
podemos ficar invocando os mortos, que uma hora eles aparecem e vem nos
visitar. Assim aconteceu com Maquiavel, ele resolveu visitar Brasília. Como um
bom mestre, veio constatar se seus conselhos estavam sendo colocados em práticas
da forma como ele ensinou aos seus discípulos e não poderia demorar muito
porque já tinha um voo marcado para Curitiba neste mesmo dia.
Para
recepciona-lo, estiveram presente três ministros do STF e ao passar pela Praça dos Três
Poderes, surpreendeu-se com a quantidade de “Príncipes” vindo de diversas
cortes: de caciques, coronéis, oligarcas, linhagem, diferentemente das cortes
na velha Itália, que se moviam em torno de um único Príncipe.
Com
sua astúcia, percebeu logo que por aqui existem vários polos de poder, sem que
isso signifique democratização. E identificou na capital do Brasil uma luta de
poder multipolar bem mais complexa dos que as disputas entre o Reino de
Nápoles, o Ducado de Milão, os Estados Pontifícios e a República de Veneza.
Prosseguindo
em sua observação, Maquiavel verificou que no Distrito Federal, mesmo passados
cinco séculos da publicação de seu clássico livro (não à toa intitulado O
Príncipe), o que alimenta a política é a conquista e a manutenção do poder,
conforme já denunciava no livro.
Independentemente
de outros aspectos. E que, ainda conforme preconizou, muitos políticos se valem
de todos os meios para se manter no comando.
Assim,
constatou que a sua lição de que os fins justificam os meios foi muito bem
aprendida pelos nobres que frequentavam aquela praça.
Ao
tomar conhecimento da Vasa-Jato, o pensador, que nasceu em 1469 em Florença
(onde também morreu, aos 58 anos), ficou atordoado: como vocês permitiram que Deltan Dallagnol e outros procuradores agissem ao
arrepio da lei para obter dados sigilosos da Receita Federal de pessoas que
queriam investigar.
Ouvindo os relatos sobre a
investigação, disse que os Príncipes daqui exageram no tocante a não serem
limitados pela moralidade. Teria inclusive sugerido às minhas fontes que até
para ser imoral deve existir um limite. E que o limite é o bom-senso, artigo em
falta no país.
Sabendo
que a Lava-Jato estabeleceu um conluio com o
juiz Sérgio Moro para, de forma questionável, levar o ex-presidente Lula à
prisão, terem se beneficiado com dinheiro em palestras para empresas que eram
investigadas na operação e terem incentivado ilegalmente a investigação de
ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), Maquiavel pensou em sugerir
uma ampla anistia aos procuradores, desde que eles fossem banidos da vida
pública e se retratassem publicamente. Ignorou comentários irônicos de que eles
não conhecessem a Constituição e que por aqui, como a esperança é sempre a
última que morre, é melhor ir empurrando tudo com a barriga.
Já
no aeroporto desistiu de ir a Curitiba para conhecer o presidente Lula,
Maquiavel declinou do convite. Temia que em um surto de ativismo judicial
pudesse indicia-lo nos inquéritos e ficasse assim, impedido de voltar ao Além.
Vá lá que alguém o delatasse?! Preferiu não arriscar.
Nesse
sentido, viu que os políticos no Brasil de hoje não levam em conta a história.
Que a maioria mal sabe o que é história – pensa que é o que está no jornal de
ontem e nem desconfia que ela pode ensinar.
Viu
ainda que o Brasil e os brasileiros aproximam-se para o momento crucial, que
pode revelar um país ameaçado de ser tomado pelas milícias. Seu poder
intimidatório, somado aos das milícias virtuais alimentadas pelo Soberano, em
nada fica a dever aos porões da ditadura. É um poder paralelo e assassino.
Daí o desprezo pela história e o descuido com o futuro.
Vendo
a confusão instalada, teve medo do que seus cicerones falavam a respeito do
Brasil, pediu licença aos três amigos e marcou o mais rápido a passagem e
voltou para o além.
Padre Carlos
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