domingo, 6 de outubro de 2019

ARTIGO - O que é a social-democracia? (Padre Carlos)




O que é a social-democracia?


A social-democracia apesar de continuar tendo apoio popular em diversos países foi derrotada com um “abraço de urso” pelo capitalismo. Em vez de transformar o capitalismo, foi transformada por ele.
Levantei recentemente no meu blog, uma polémica sobre a social-democracia e os partidos políticos brasileiros que nela se reveem ou que apresentam programas eleitorais que nela se enquadram. Se avaliarmos os partidos no nosso país, poderemos afirmar que todos os principais da esquerda brasileira tem no deu conjunto uma ação ideológica social- democrata.
       
     Eu vou fazer para os leitores uma breve excursão na história do movimento social-democrata na tentativa de responder à pergunta do título.
Os partidos sociais-democratas surgiram para representar a classe operária e os trabalhadores em geral, lutar pela sua emancipação e pelo fim do capitalismo que daria lugar ao socialismo. Inicialmente, a estratégia considerada adequada para atingir esse objetivo era a revolucionária, mas com o tempo e a repressão por parte dos Estados e governos, assim fugindo desta conjuntura, começaram a surgir vozes defendendo uma estratégia reformista e gradual. Aproveitar as eleições para ganhar poder e assim iniciar a transição para o socialismo. Uma das vozes que elaborou e publicou sobre o tema foi Eduard Bernstein, dirigente do SPD (partido social-democrata alemão – partido referência do movimento social-democrata). Bernstein formulou teoricamente uma revisão crítica de várias teses marxistas e defendeu que no quadro do sufrágio universal (que era o voto masculino) e dada a superioridade ética do socialismo, os trabalhadores podiam usar as eleições, o parlamento e o governo para avançar legislativamente rumo ao socialismo. Segundo ele, o movimento (focado nas reformas) era tudo e o objetivo final nada. A revolução era desnecessária.
Desde o início do século a social-democracia  foi se afastamento de forma contínua em relação à sua versão original. Foi só na conferência de Bad Godesberg, em novembro de 1959, que o SPD mudou formalmente a sua orientação política e ideológica abandonando o marxismo e o objetivo de superar o capitalismo. Nesta época os partidos sociais-democratas estavam focados na defesa do pleno emprego e do Estado Social, que estava sendo desenvolvido em vários países europeus, dentro de uma perspectivas ideológicas, no quadro dos chamados “ os gloriosos trinta anos”, que foram as décadas com taxas relativamente elevadas de crescimento económico, onde as relações comerciais desiguais com os países coloniais e ex-coloniais (as independências formais não acabaram com a exploração) e o medo que as burguesias nacionais tinham do movimento comunista desempenharam um papel fundamental.
A partir da década de 1970 e da crise do petróleo, com a estagflação (estagnação económica e inflação) e da entrada na época da ascensão do neoliberalismo, os partidos sociais-democratas foram-se tornando defensores da necessidade de adaptar (na prática reduzindo-o) o Estado Social, apoiando a globalização, a liberalização e as privatizações como forma de promover o crescimento económico. Passaram a apresentar-se como gestores do capitalismo dando-lhe uma “face mais humana”. Esta postura consolidou-se na década de 1990 com a chamada Terceira Via. Este foi um dos motivos que levaram FHC e seus teóricos a perderem por completo suas origens.
Portanto, a social-democracia numa primeira fase queria acabar com o capitalismo, na fase seguinte quis realizar reformas rumo aos socialismos, depois aceitou o capitalismo defendendo o Estado Social e o pleno emprego, posteriormente abandonou a ideia de pleno emprego e uma adaptação do Estado Social às exigências dos mercados internacionais e dos privados. Na prática, com o tempo, muitos partidos sociais-democratas tornaram-se partidos neoliberais.
Mas então, o que é afinal a social-democracia? Como vimos há várias versões históricas de partidos político e fases cujo percurso é de um afastamento maior ou menor em relação à sua génese. A social-democracia apesar de continuar tendo apoio popular em diversos países, sua versão mais liberal está sendo derrotada com um “abraço de urso” pelo capitalismo. Em vez de transformar o capitalismo, foi transformada por ele. Um exemplo clássico deste fenômeno, é o PSDB aqui no Brasil.
Se fizermos uma análise historiográfica e sociológica sobre a trajetória do Partido dos Trabalhadores, PT, iremos comprovar que ele cumpriu no Brasil de forma concentrada todas as três fases que caracterizaram os partidos social-democratas na Europa: uma primeira apoiada nas lutas operárias, com forte conteúdo ideológico socialista e de oposição extra-parlamentar privilegiando a ação direta, especialmente a grevista. Essa fase foi da fundação em 1980 até 1989. Uma segunda fase é a da consolidação como partido institucional, sendo a principal força de oposição dentro do parlamento e com grande peso de deputados e de profissionais políticos. Ela ocorre durante uma década de fraca mobilização social, durante os dois governos FHC, entre 1990 e 2002.
A terceira é da ascensão ao poder, indo de 2002 até hoje, com a descaracterização do ideário socialista fundador em prol de um pragmatismo e, além de uma política eleitoralmente bem sucedida de assistência social junto com uma aliança estratégica com os setores organizados da sociedade civil, financeiro e o agronegócio.
       
 Podemos concluir que o movimento social-democrata teve um papel importante no apoio ao capitalismo, na procura de soluções para os seus problemas, na criação de condições para os trabalhadores (sobretudo dos países europeus) melhorarem as suas vidas e na oposição a movimentos que tentaram construir uma alternativa ao capitalismo (que era a meta original da social-democracia).
Deveríamos avançar nestas questões e aprofundar nossos conhecimentos nas nossas ações e conhecer de perto todo o nosso arcabouço teórico.


Padre Carlos



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