Amigos
podem ser irmãos
Existe amigos em todas
fases da nossa vida, estão sempre lá, gravados nas nossas lembranças. É como família,
nosso sangue, nossa história. Por isso, se você tem amigos, mime-os,
cultive-os, ame-os.
Já faz algum tempo que venho sentindo
saudade de alguns amigos, saudade de um tempo, estou ficando meio “retrô”,
saudosista, que guarda como um tesouro memórias de uma história de vida, de uma
geração e das lutas que vivi. Como aqueles doces momentos da infância, que se
perdem na Pituba da década de sessenta e sua suave inocência; as inquietações e
descobertas da adolescência no Areal; a conquista de uma certa liberdade na
juventude com a Igreja e a luta contra a ditadura; a passagem insegura para o
mundo adulto. No seminário e ministério sacerdotal.
Em todas essas fases, há sempre
aqueles com quem compartilhamos angústias e alegrias, paixões e desilusões, as
confidências indiscretas. São os amigos mais chegados de determinada época –
alguns já distante dos olhos, mas tão perto do coração! Posso dizer que contei
com ouvidos atentos e ombros disponíveis! Tão alentador saber que ainda hoje
posso contar com alguém que ora por nós, torce pelo nosso sucesso, sofre com
nossas dores, ri das nossas piadas sem graça, aguenta firme quando damos “piti”
por bobagem, nos passa bronca quando merecemos e aponta nossos erros sem a
menor intenção de nos julgar. Amigo é assim, chega junto, sente saudade e às
vezes chama a nossa atenção como se tivesse brigando.
Nesta semana ao saber da morte de uma
amiga em Salvador, vítima do covid-19, me fez lembrar como é importante resgatar
a memória destes amigos. Espero quando esta pandemia passar, poder rever
colegas e amigos que fiz na Pituba, no Nordeste, na militância política e na
Igreja. São mais de 40 anos de lutas e histórias que separam aquela juventude.
Alguns estarão mais gordos, carecas ou grisalhos. Todos com marcas do tempo no
rosto.
Poderia ser um grande encontro, onde
iriamos nos redescobrir jovens, ainda cheios de sonhos, ainda que os “sessenta”
já tenha chegado, avisando que estamos no time dos legalmente idosos, com
direito a carteirinha e tudo. E nós, ah, não estamos nem aí pra isso. Gostaria
mesmo era de curtir as baladas dançantes de nossa época – toca Abba, Bee Gees e
Dona Sommer aí, DJ – alheios às dores na coluna.
“Tô nem aí” será nosso brado uníssono
para o avanço dos anos. Tô nem aí para as diferentes opções políticas de meus
amigos – elas não nos arranham ou separam. Tô nem aí pra quem nos achar
ridículos dançando discoteca – esses não entendem nada de genuína alegria.
Quero mais é estar perto dos amigos e amigas que fizeram ou ainda fazem parte
da minha história, sentir que o tempo não nos ergueu muralhas, que nossas
escolhas não enfraqueceram nossos laços, que nossos destinos ainda fazem linha
cruzada. E que, sim, amigos podem ser irmãos, com todas as suas
características: cumplicidade, chatice, doçura…
Quero mais é ser feliz, que todos
sejam felizes, mesmo com eventuais dores na alma e inevitáveis preocupações.
Vamos parar o tempo, vamos nos permitir comemorar em festa.
E, nesse dia, vou afagar o passado
com um carinhoso abraço de “bem-vindo ao futuro”.
Ô tempo bom!
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