domingo, 26 de julho de 2020

ARTIGO - A sentença de Noronha e a justiça seletiva (Padre Carlos)




A sentença de Noronha e a justiça seletiva



Já faz algum tempo que venho me questionando sobre o discurso de membros do Ministério Público e do Judiciário ​brasileiro quando afirmam que ​"​não há ninguém acima da lei​"​. As decisões do presidente do Superior Tribunal de Justiça, mostram que há​, ​ sim​, ​ pessoas acima da lei. Há juízes, procuradores, promotores, senadores, deputados e alguns mais que estão acima da lei​, que não vale para eles. A regra e a régua para medir o comportamento de um amigo do presidente não ​são a​s​ mesma​s​ usada​s​ para medir os presos comuns. Poderia escrever um trabalho acadêmico sobre isto, mas ficarei apenas no caso de Fabrício Queiroz e sua esposa.
O habeas corpus para Maria Aguiar espantou até os colegas do ministro, devido a forma como ele premiou a fuga da esposa de Queiroz.  Assim, ficamos surpresos com a decisão do presidente do Superior Tribunal de Justiça, ministro João Otávio de Noronha, quando liberou Fabrício Queiroz para cumprimento de prisão domiciliar, o que chamou a nossa atenção não foram os motivos humanitários que baseou sua sentença, mas, sua mudança de entendimento das leis quando se tratou deste cliente. Neste período de pandemia, nosso Magistrado já teria negado 96,5% dos pedidos similares para outras pessoas. O levantamento do próprio STJ, feito a pedido do portal G1, mostra que Noronha rejeitou 700 de 725 pedidos que chegaram à Corte alegando a necessidade de prisão domiciliar devido à pandemia do coronavírus. O presidente do STJ é o responsável pelas decisões no tribunal durante o recesso de meio de ano do Judiciário. Na última semana, Noronha negou um pedido de habeas corpus coletivo, que contemplaria pessoas detidas por crimes sem violência, apresentado pelo Coletivo de Advocacia em Direitos Humanos (CADHu). O grupo de advogados moveu a ação após o próprio Noronha dar o benefício ao ex-assessor parlamentar de Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), quando o filho do presidente Jair Bolsonaro era deputado estadual.
Este contraste entre duas decisões, escancara de vez a que ponto chegou a justiça e como estas sentenças expões a seletividade da justiça no Brasil. Diante de tais fatos, aumenta o coro de juristas e de associações de Direitos Humanos em afirmar, que a aplicação da lei no Brasil depende de vários fatores, como​, ​ por exemplo, a cor da pele, a posição social e ideológica partidária, as origens familiares, ou seja, ser de “boa família”, região em que mora da cidade, gênero, etc​.
Chamamos a atenção dos seus pares e do Supremo, que negar o habeas corpus a presos em idênticas situações, significa violar o direito a igualdade. Uma justiça que beneficia apenas alguns e condena a grande maioria do sistema carcerário, pode ser considerada uma justiça seletiva e perante o Estado de Direito, isto é inaceitável.
        
Ao fechar os olhos e negar o pedido de habeas corpus impetrado pelo Coletivo de Advocacia em Direitos Humanos, para milhares de idosos, cardíaco, diabéticos, tuberculosos e hipertenso, ele está colocando em risco todo o sistema.  Além disso, o Ministério da justiça informou nesta sexta-feira, que no sistema penitenciário brasileiro, já morreram 72 presos e dez mil internos, foram infectados.
Precisamos com urgência rever os casos dos presos em idênticas situações. Só desta forma a justiça poderá resgatar o sentido de imparcialidade: “Equidade; qualidade da pessoa que julga com neutralidade e justiça; característica de quem não toma partido numa situação. ”

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