sábado, 13 de fevereiro de 2021

ARTIGO - Nossa esquerda preconceituosa (Padre Carlos)

 


Nossa esquerda preconceituosa




Peço licença aos leitores, para iniciar este artigo citando o grande Santo Agostinho (354-430) disse: “Teus pecados são a tua tristeza, deixe que a santidade seja a tua alegria”.
Faz alguns anos que li um artigo da jornalista Camila Marciel - em sua coluna na Agência Brasil São Paulo, a repórter tratava da forma brutal como o DOI-Codi sequestra e mata Manoel Fiel e diz que o metalúrgico cometeu suicídio. O que causa surpresa, é que a morte do metalúrgico ocorreu menos de três meses após o assassinato do jornalista Vladimir Herzog, no mesmo local e em circunstâncias parecidas, sob a versão oficial de suicídio e não teve o impacto e a revolta que a imprensa e a “esquerda democrática” demostraram no caso do jornalista assassinado.


Neste texto, Gostaria de levantar algumas questões para que possa servir de reflexão para o conjunto da esquerda no que se referem aos erros, conceitos e pré-conceitos de classe que persistem em existir em nosso meio. Assim, é preciso dizer que nem sempre colocar de forma clara e corajosa aquilo que muitos não têm coragem e/ou interesse em fazê-lo, pode não ser interessante ou compensador para o articulista, mas quando o objetivo é ajudar o leitor a refletir, temos a obrigação de correr este risco. Demostrar como a imprensa e a esquerda brasileira tratou ao longo da sua história alguns fatos de forma desigual, chamou nossa atenção para alguns acontecimentos que tiveram como referencia dois pesos e duas medidas.

            A sociedade brasileira, ou melhor, as elites e a classe média, ao se formarem, foram se contaminando cada vez mais, com um preconceito velado de classe social, ou seja, as pessoas são preconceituosas, mas fingem não ser em muitas situações. Diante desta constatação, podemos dizer que a nossa esquerda não pode fugir da regra, por fazer parte ou por ter na maioria de seus quadros, muito destas origens.  Para avaliar como o preconceito está embutido na esquerda brasileira, basta analisar o comportamento da imprensa ou da classe média em relação ao fato citado no início deste artigo. Já paramos pra pensar porque até hoje não temos na história da UNE um presidente negro? E porque as elites tem um ódio de Lula e de tudo que ele representa? Embora estes exemplos sejam dignos de ser desenvolvidos e aprofundados com relação ao nosso tema, prefiro abordar este assunto com um fato fora das fileiras da esquerda e que demostra claramente este preconceito. Assim, no início de fevereiro de 2015, em um único final de semana, a Rondesp (Rondas Especiais) da Polícia Militar baiana assassinou 15 jovens negros em crimes com características de execução. As operações policiais daquele final de semana foram parte de uma vingança contra um policial que havia levado um tiro nos dias anteriores.  Com isto, a esquerda da boa terra, se tornou a mão destes carrascos ao fechar os olhos e não denunciar nem se escandalizar com aquela chacina. Naquela época, não vi ninguém do diretório nacional ou algum deputado se posicionando contra as posições do atual governador. Queria lembrar aos leitores que era carne preta, esta tem pouco valor no mercado. Porem basta o mesmo homem da caneta, cortar o salario dos grevistas, isto é, de uma elite do funcionalismo público para o circo pegar fogo. Será que o grande mal da esquerda é só o corporativismo? Será que neste comportamento não há um preconceito de classe e racial? Não quero omitir nem justificar os crimes dos envolvidos, mas se este fato se desse com jovens de classe média no mesmo local e em circunstâncias parecidas, sob a versão oficial de confronto, teria tido o mesmo desfecho?  Porque estas mortes não provocou a mesma comoção nos nossos políticos e nas instancias dos partidos de esquerda, como tiveram os descontos no contra cheque daqueles funcionários públicos?

           


Quando chegamos a uma determinada  idade, podemos com nossa experiência afirmar que a arte de fazer política, com certeza é a capacidade de engolir sapo. Infelizmente, as questões citadas vão além dos sapos engolidos, estamos falando de princípios e dignidade.  Por isto, acredito que ser de esquerda é um desafio. Acredito que requer muita “dureza”, mas, também, um senso de justiça sem nenhum preconceito, para que possamos criar uma comunidade justa e democrática.


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