sábado, 2 de setembro de 2023

ARTIGO - O Declínio dos Grupos e Tendências na Esquerda. (Padre Carlos)


A Ascensão dos Mandatos e o Fim da Ideologia

 


    Nos meus anos de dedicação à teologia e à política, pude testemunhar uma transformação profunda na dinâmica dos partidos de esquerda. Hoje, gostaria de abordar um tema crucial que tem afetado significativamente a política de esquerda: o desaparecimento de grupos e tendências dentro desses partidos. Isso parece estar intrinsecamente ligado ao surgimento dos mandatos políticos e à sua influência crescente sobre a estrutura partidária.

    Antes de abordarmos essa questão, é importante destacar que os grupos e tendências partidárias costumavam ser os pilares da diversidade ideológica dentro dos partidos de esquerda. Eles eram os espaços onde os membros podiam debater e desenvolver ideias, muitas vezes discordantes, mas que enriqueciam o panorama político. No entanto, algo mudou no cenário político brasileiro.

    A ascensão dos mandatos políticos trouxe consigo um novo foco: a eleição e reeleição desses mandatos. Isso mudou a dinâmica interna dos partidos de esquerda de maneira profunda. Agora, a meta principal parece ser manter ou conquistar cargas eletivas, relegando para um segundo plano as discussões ideológicas e programáticas.

    Essa mudança de paradigma tem sérias consequências para a política de esquerda. Em primeiro lugar, a busca incessante por mandatos políticos cria uma competição interna feroz que muitas vezes leva a divisões e conflitos. Em vez de unir forças para promover mudanças sociais significativas, os partidos de esquerda muitas vezes se fragmentam em facções que buscam interesses próprios.

    Além disso, a concentração de poder em torno dos mandatos políticos cria uma estrutura hierárquica que muitas vezes sufoca a participação da base. Os membros dos partidos veem em uma posição de subordinação em relação aos políticos eleitos, que determinam grande parte do controle sobre os recursos e a agenda partidária.

    Outro problema grave é a perda da essência ideológica. Com a eleição como objetivo central, os partidos muitas vezes abandonaram suas raízes ideológicas em nome da conveniência eleitoral. Isso leva à diluição das propostas de esquerda e à adoção de políticas que buscam um eleitorado mais amplo, mas que podem comprometer os princípios originais.

    Portanto, o desaparecimento dos grupos e tendências dentro dos partidos de esquerda não é apenas uma mudança interna, mas uma transformação que afeta diretamente a qualidade da democracia e a capacidade da esquerda de promover mudanças efetivas na sociedade. É crucial que reflitamos sobre essa questão e busquemos maneiras de resgatar a diversidade ideológica, a participação da base e o compromisso genuíno com uma agenda progressista.

    Num momento em que a sociedade enfrenta desafios complexos, a esquerda não pode se dar ao luxo de perder sua identidade e tornar o jogo eleitoral como único objetivo. Precisamos encontrar um equilíbrio entre a busca pelo poder político e a manutenção dos princípios que sempre nos guiaram. Só assim poderemos contribuir verdadeiramente para a transformação da sociedade.

 

 


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