sexta-feira, 9 de agosto de 2019

ARTIGO - Calígula ao Johnny Bravo ( Padre Carlos )




Calígula ao Johnny Bravo
            


           Calígula, e a sua loucura e total indiferença pelas vidas alheias continuam a ser o modelo no qual encontramos todos os fascistas.
            Faz alguns anos que li a peça de teatro Calígula, de Albert Camus, estreada no ano de 1945, mas revendo meus apontamentos fiquei surpreso com a semelhança de certas figuras do nosso cotidiano.
            Quando o escritor existencialista estreou, este espetáculo, dois Calígulas modernos, saiam da cena política: Hitler e Mussolini, inicialmente apoiados pelo povo alemão e pelo povo italiano – sinal inquietante –, foram finalmente derrotados pelos Aliados, ao cabo de mais de 50 milhões de mortos. O que nos remete uma preocupação com o novo personagem daquela peça de Camus:
     
       Estamos agora no séc. XXI, no tempo de Calígulas pós-moderno e com capacidade de exterminar dez vezes maior e seus opositores e vitimas continuam acreditando na democracia e no Estado de Direito enquanto a fera é alimentada.  “Agora mandam os Johnny Bravo”.  Por mais que busquemos explicação sobre as razões que teriam feito o mundo entrar numa era de crueldade e de impunidade para os poderosos, não consigo encontrar uma resposta que justifique tal conjuntura.
            Assim como o nosso Johnny Bravo, Calígula “inflamava o coração dos romanos procurando a popularidade por todas as formas”. A mesma preocupação que têm, 20 séculos depois de Calígula, o nosso presidente busca através dos novos coliseus e utilizando das grandes concentrações legitimar seu projeto de governo autoritário.   Onde seus projetos neoliberais prosperam, quer de forma imposta quer com uma roupagem de democracia, tudo parece ser permitido. Com o crescente desdém pelas normas éticas, sem dúvida, a sinistra progressão dos baixos instintos, quer na política nacional, quer na política mundial, com óbvia influência nos conflitos que assolam o planeta.
            Sem esquecer os contextos históricos tão distintos, bem podemos dizer, hoje, que as terríveis atrocidades cometidas por Calígula durante os três anos, dez meses e oito dias (do séc. i d.c.) em que reinou como imperador – até ser assassinado quando tinha 29 anos – só muito dificilmente poderia ser comparadas com as carnificinas cometidas durante o séc. xx, Holocausto incluído, e mesmo com as carnificinas já cometidas, ou ainda em curso, no séc. XXI. Mas, Calígula tem como companheira, a sua loucura e a total indiferença pelas vidas alheias, estes  continuam sendo o modelo no qual se pode rever, indubitavelmente este nosso presente. Bolsonaro também despreza a vida e a dignidade dos adversários, mas, além de ser, de longe, o mais desfavorecido pela inteligência, ainda não passou à prática o que nele há de pior. No entanto, há em quase todos estes políticos brutais – assim como no Calígula caracterizado por Suetónio – “dois vícios absolutamente opostos: uma insolência extrema e, por outro lado, uma extrema covardia”. E não nos iludamos em relação ao seu amigo e atual Presidente dos EUA. Bolsonaro está disposta a ignorar todas as violações dos direitos humanos, ou todos os assassínios cometidos por um Estado, desde que este tenha boas relações pessoais com Donald Trump – que é mais evidente e repugnante.
            Desfazendo acordos, pactos e tratados internacionais – com o perverso prazer de um menino mimado que vai colocando abaixo uma construção de valores e patrimônios que o pai ou o avô ergueu pacientemente para entreter –, Trump e os EUA”.
            Além do Brasil e dos EUA, podemos constatar que é cada vez mais presente na Europa a presença desta “nova “ordem”“. Estamos vivenciando uma forte presença destes Calígulas na Hungria como na Polónia, mas também em França e, sobretudo na Itália. Estes são capazes de assumir claramente as suas origens históricas e ideológicas, sem nenhum constrangimento. Com isto, presenciamos alguns jornalistas (também aqui no Brasil,) que acham incorreto atribuir aos movimentos populistas de direita antecedentes fascistas ou nazis, porque se trata – dizem eles – de um fenómeno político novo (?) que nem eles sabem ainda no que vai dar (!). Ou seja: há palavras que revelam ou escandaliza e que, por isso, não devem ser usadas na imprensa supostamente “nas grandes mídias do país”. Todavia, não é nada difícil – nem sequer tabu – identificar não só a nostalgia dos autoritarismos da primeira quadra do século passado, mas também as raízes desses populismos autoritários em ascensão na Europa, no Brasil e na EUA, claramente neofascistas e neonazis.
   
         Estamos sob ataque  do domínio do narcisismo – patológico em Calígula – e que também parece afetar, hoje, elites arrogantes, aparentemente revoltadas, que desprezam o povo. É, aliás, o narcisismo que, quer na política quer na imprensa, sustenta as imagens tabloides de narcisistas do Sr. Jair Messias Bolsonaro, para só citar os exemplos mais óbvios, o Presidente do STF admitiu em uma revista de grande circulação, que o atual presidente esta brindado e existe um pacto para impor o seu projeto de governo.

Padre Carlos




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