O PT e a nova esquerda no Brasil
O Partido dos Trabalhadores (PT) surgiu na década de 1980 como
uma expressão das lutas sociais e políticas dos trabalhadores, dos movimentos
populares e das forças de esquerda contra a ditadura militar e o
neoliberalismo. O PT se apresentava como um partido diferente dos demais, que
buscava construir uma alternativa socialista, democrática e popular ao modelo
de desenvolvimento excludente e dependente do capitalismo brasileiro.
Ao longo de sua trajetória, o PT enfrentou diversos desafios e
dilemas, que envolveram tanto a sua relação com as classes dominantes e as
instituições do Estado, quanto a sua capacidade de manter a sua identidade e
coerência programática, ética e ideológica. O PT passou por processos de
transformação interna, que envolveram disputas entre diferentes tendências ou
correntes, que expressavam distintas concepções sobre o papel do partido, a
estratégia de mudança social e o projeto de sociedade.
Nesse contexto, emergiu o que se convencionou chamar de nova
esquerda, uma forças políticas e sociais que se opunham ao comunismo
de estilo soviético e buscavam renovar o pensamento e a prática da esquerda no
Brasil e no mundo. A nova esquerda se caracterizava por defender uma abordagem
mais democrática, pluralista, participativa e emancipatória do socialismo, que
valorizava a diversidade de sujeitos, demandas e movimentos sociais, bem como a
autonomia da sociedade civil em relação ao Estado.
A nova esquerda teve uma influência importante na formação do
PT, que incorporou em seu programa e em sua organização elementos dessa visão.
No entanto, a nova esquerda também enfrentou limites e contradições, que se
manifestaram na dificuldade de articular uma proposta consistente e viável de
superação do capitalismo, na tendência à fragmentação e à dispersão das lutas
sociais e na vulnerabilidade às pressões e às seduções do sistema político
institucional.
Um dos principais problemas que se colocou para o PT e para a
nova esquerda foi o de como conciliar a participação nas eleições e nos
governos com a manutenção da mobilização social e da radicalidade política. O
PT conseguiu chegar ao poder em diversos níveis da federação, culminando com a
eleição de Lula à presidência da República em 2002. No entanto, esse processo
também implicou em concessões, alianças, compromissos e adaptações que afetaram
o caráter original do partido.
Como analistas tenho presenciando nestas quatro décadas a perda e a capacidade de mobilização do PT de apresentar uma utopia onde os militantes se entreguem ao projeto sem que necessariamente tenha na pauta cargos e compensação financeira. Na minha visão, o PT passou por um processo de burocratização, se institucionalizado e se perseber foi sendo cooptado pelo sistema político dominante, transformando os sindicalistas, os antigos militantes dos partidos comunistas e das organizações de esquerda em verdadeiros cabos eleitorais.Foi também como analistas que presenciei o PT realizar avanços significativos na melhoria das condições de vida da população mais pobre, na ampliação dos direitos sociais e na promoção da participação popular nos espaços públicos.
Acredito que o PT conseguiu apesar de tudo, manter uma postura crítica e transformadora diante das estruturas do poder, quando buscou construir um projeto nacional-popular que combinasse desenvolvimento econômico com distribuição de renda e democracia.
Apesar destas duas perspectivas
que testemunhei expressarem aspectos reais e contraditórios da
trajetória do PT e da nova esquerda no Brasil, vejo neste
partido um pragmatismo e a falta daquele combustível utópico que tanto embalou
minha geração. Não se
trata aqui de negar ou exaltar acriticamente os erros ou os acertos do
partido, mas de compreender os seus limites e as suas potencialidades no
contexto histórico em que atuou e atua. O PT não é nem o salvador nem o traidor da esquerda
brasileira. O PT é um partido em disputa, que reflete as tensões e os conflitos
da sociedade brasileira.
A crise política atual coloca novos desafios para o PT e para a
nova esquerda. Diante do golpe parlamentar-judicial-midiático que afastou Dilma
Rousseff da presidência em 2016, da prisão arbitrária de Lula em 2018 e da
ascensão do governo autoritário e ultraliberal de Jair Bolsonaro em 2019 e
a volta de Lula, não e possível que não tenhamos aprendido nada. É preciso reafirmar a defesa da democracia, dos
direitos humanos e da soberania nacional como bandeiras fundamentais da
esquerda.
Ao mesmo tempo, é preciso reconhecer os erros cometidos pelo PT
nos seus governos, fazer uma autocrítica sincera e profunda das suas práticas
políticas e éticas e renovar o seu programa e a sua organização para recuperar
a confiança e a esperança da classe trabalhadora e dos setores populares. A
Federação foi e está sendo inpotente para fortalecer a unidade da esquerda em torno de um projeto comum
que seja capaz de enfrentar as ameaças do neoliberalismo, do fascismo e do
imperialismo.
O PT tem um papel importante a cumprir nessa tarefa histórica.
Mas não pode fazê-lo sozinho nem isolado. É preciso dialogar com as outras
forças políticas progressistas, com os movimentos sociais organizados, com as
novas formas de resistência popular que emergem nas ruas, nas redes sociais,
nas periferias, nas favelas, nos campos. É preciso construir uma nova esquerda
que não seja capa preta ou de sapato auto, ela precisa ser plural, diversa, criativa, democrática
e socialista.
Esse é o desafio que se coloca para o PT no século XXI: ser um
partido capaz de conquistar com o coração sua militância, antes de tentar mobilizar as massas para transformar o
Brasil.
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