terça-feira, 27 de junho de 2023

ARTIGO - Anos Dourados: O Surgimento de uma nova esquerda. (Padre Carlos)

 


Efervescência do Movimento Estudantil

 


No calor dos anos 80, quando o Brasil ainda lutava para  se libertar da ditadura militar, nascia um partido político que parecia mais um sindicato ou com o movimento estudantil. Este partido começava a ganhar força e conquistar corações e mentes. Era o Partido dos Trabalhadores (PT). Naquela época o partido parecia mais  um guarda-chuva onde era  acolhido diversas organizações de esquerda em busca de um ideal comum. Essa época também ficou marcada pelos chamados "anos dourados", do movimento estudantil e como a maioria dos militante vinha das universidades é interessante relembrar um momento histórico ocorrido em 1981, na Universidade Federal da Bahia (UFBA), que mostrou o protagonismo e a efervescência do movimento estudantil daquela época.

Dois eventos foram particularmente emblemáticos: o Encontro Nacional dos Estudantes de Pedagogia e a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Ambos atraíram jovens de diversas partes do país, que buscavam intercâmbio de ideias, debates acalorados e, acima de tudo, uma voz ativa na construção de uma nova realidade política.

No Encontro Nacional dos Estudantes de Pedagogia, a UFBA se tornou o palco de uma verdadeira confluência de ideias e experiências. Os padre Jesuitas abriram suas portas para a embaixada do Pará e hospedou estudantes em paróquias e casas de conhecidos, fortalecendo os laços de solidariedade e fraternidade entre os participantes. Nesse contexto, o movimento estudantil despontava como uma promissora organização, uma vez que acolhia diferentes grupos e tendências de esquerda, sendo um verdadeiro ponto de convergência para aqueles que ansiavam por mudanças profundas na sociedade.

Já a SBPC trouxe consigo o clamor pelo fim da ditadura, representando um grito de resistência e liberdade. O clima de mobilização e esperança era tangível, impulsionado por um movimento estudantil vigoroso, ávido por mudanças sociais e políticas. As festas nas residências estudantis ou em estabelecimentos locais se tornaram momentos de descontração e união, onde se dançava ao som de Elba Ramalho, Alceu Valença e Luiz Gonzaga. O Nordeste estava em alta, e o sotaque nordestino encantava a todos, tornando-se uma marca de sucesso e identificação.

Nesse contexto, dois partidos exerciam papéis relevantes: o Partido Comunista do Brasil (PCdoB) e o Partido Comunista Brasileiro (o antigo "Partidão"). O PCdoB contava com uma grande  influência e uma máquina organizativa "Viração" se estruturava dentro da tendência popular no antigo MDB. Enquanto isso, o "Partidão" apresentava uma estrutura mais profissionalizada e organizada, tendo consolidado sua presença no cenário político nacional. Já o PT, em seus primeiros anos, funcionava como uma força aglutinadora dessas diversas organizações de esquerda. Os grupos eram identificados por seus jornais ou pela sua origem. Assim, tínhamos o pessoal  do PCBR, que era indentificar como o  pessoal do Povão, o pessoal de Macarrão, os independentes, o pessoal do 113 e o pessoal do racha e etc. Cada grupo trazia consigo suas próprias perspectivas e propostas, mas todos compartilhavam o anseio por justiça social e transformação.

Essa efervescência política e cultural dos anos dourados refletia a energia de uma juventude engajada, sedenta por participação e por moldar o futuro do país. O ambiente universitário proporcionava um espaço propício para debates acalorados, troca de experiências e formação de consciência política. Era uma época em que os estudantes se sentiam empoderados, cientes de que poderiam influenciar e transformar a realidade ao seu redor.

Nesse contexto, a UFBA assumiu um papel central, abrindo suas portas e corações para receber estudantes de todo o Brasil. As paróquias e as casas de conhecidos se tornaram abrigos para os jovens viajantes, criando laços de amizade e solidariedade que ultrapassavam as fronteiras geográficas. A troca de experiências e ideias fortalecia a união entre os participantes, consolidando um espírito de coletividade e um senso de pertencimento a um movimento maior.

O PT, como um guarda-chuva das organizações de esquerda, desempenhava um papel fundamental naquela época. Era um espaço de convergência, onde diferentes ideologias e grupos se encontravam para construir uma agenda política comum. O partido se destacava por sua capacidade de unir as demandas e aspirações das diversas correntes de pensamento, consolidando-se como uma alternativa real de transformação social.

Além da política, a cultura também desempenhava um papel importante nesse momento histórico. A música, em especial a música nordestina, servia como trilha sonora para os encontros e festas, expressando a diversidade e a riqueza cultural do país. Os ritmos de Elba Ramalho, Alceu Valença e Luiz Gonzaga embalavam as noites de celebração, tornando-se símbolos de uma identidade que se fortalecia e se afirmava.

Os anos dourados do movimento estudantil representaram um momento de efervescência, de luta e de esperança. Foi uma época em que os jovens se uniram em prol de uma sociedade mais justa e igualitária, deixando de lado diferenças e divergências em nome de um ideal maior. Embora o tempo tenha passado e muitas transformações tenham ocorrido desde então, é importante lembrar desse período como um marco na história política e social do Brasil, que demonstrou a força e a capacidade de mobilização de uma juventude determinada a mudar o mundo.

Hoje, olhando para trás, podemos refletir sobre o legado deixado por aqueles jovens. O movimento estudantil daquela época plantou sementes de conscientização e ativismo que deram muitos frutos e  continuam a florescer até os dias de hoje.


Nenhum comentário:

ARTIGO - A geração que fez a diferença! (Padre Carlos)

A geração que fez a diferença!      Decorridos tantos anos do fim da ditadura, observa-se que a geração da utopia está partindo e a nova...