A Igreja e sua estrutura de
poder
Vivemos
tempos de esperança. A Igreja tem uma "oportunidade de ouro", já que
é, sociologicamente falando, católica, espalhada por todo o planeta, e a única
instituição mundial que está estruturada, hierarquizada e que forma uma
unidade. Não há outra. E é a única com capacidade de opor-se ao capitalismo
financeiro dominante, que faz do dinheiro autêntico bezerro de ouro. Desde os
tempos de Constantino, nunca a Igreja esteve tão livre do poder. Mas apesar de
está vivendo esta primavera de praga, não se libertou ainda do modelo
piramidal, com o Papa no vértice e um protagonismo excessivo, para a
descentralização em rede, com um nó central que é o papado. “Se houvesse mesmo
estas mudanças, entraríamos verdadeiramente na idade de ouro do cristianismo”.
Este é o sonho, nossa utopia concretizável, do sociólogo católico Javier Elzo,
expresso e desenvolvido numa obra importante, que obriga a refletir, com o
título "Quem manda na Igreja? Um estudo mais profundo sobre a sociologia
do poder na Igreja Católica do século XXI".
Evidentemente,
a missão da Igreja é que os seus membros e os seus grupos sejam
"testemunhas do invisível e ao serviço dos mais pobres e
necessitados", aplicando o amor, a denúncia profética de um mundo injusto,
a proposta de outro mundo mais justo.
Mas a Igreja é também terrena e precisa de organização. Ora, a sua presente
estrutura não se adequa aos tempos atuais nem ao Evangelho, já que "a
Igreja somos todos nós". De fato, o que é que se constata? "A voz que
se ouve na Igreja é a voz de homens celibatários, enquanto a voz das mulheres e
a dos homens casados quase não se ouve. Temos de reconhecer que um organismo
que se diz católico, portanto, universal, onde mais da metade dos seus membros,
as mulheres, e a grande maioria da outra metade, homens casados ou solteiros,
mas não celibatários, quase não têm voz, é um organismo um pouco estranho.
Raro. Preocupante." Afinal, quem decide na Igreja e como? Poucos, homens
celibatários e de idade muito avançada, de tal modo que, para eleger o seu responsável
máximo, o Papa, entre um grupo seleto de pouco mais de cem homens, foi
decretado que tenham direito a voto apenas os que não ultrapassaram os 80 anos
de idade. Sim, a Igreja, que representa a sexta parte dos habitantes do
planeta, é "uma Igreja piramidal, com um Papa com poderes praticamente
ilimitados" ("monarca absoluto", diz o teólogo J. M. Castillo),
"uma Igreja gerontocrática, masculina, clerical, europeia, Igreja que é
governada, em última instância, por poucas pessoas: o Papa, os bispos em exercício
e a burocracia da Cúria Romana". O modo de tomada de decisões na Igreja é
"hierárquico, vertical, onde não brilha a transparência, e com exclusão da
maioria".
Impõe-se um novo modelo de Igreja e de governança, no sentido da
sinodalidade, pois o que a todos diz respeito deve ser participado e decidido
por todos. A sinodalidade (caminhar em conjunto) é o modelo a seguir em todos
os níveis: paroquial, diocesano, provincial, nacional, continental, planetário.
Para que a Igreja se afirme como comunhão, Povo de Deus, com a participação de
todos.
J. Elzo começa por criticar, aliás na linha do Papa Francisco, que na
Filadélfia declarou que o futuro da Igreja passa pelos leigos e pelas mulheres,
a clericalização da Igreja. E acentua fortemente que os cargos na Igreja,
nomeadamente o papal e o episcopal, devem ser temporários, o que permitiria,
por exemplo, eleger um Papa ou bispo mais jovens, já que não haveria o perigo
da eternização no cargo.
Pensando na Igreja universal, contra uma Igreja piramidal, centralizada e
clerical, propõe uma Igreja em rede, com um Sínodo universal enquanto estrutura
permanente, que se reúne periodicamente e não necessariamente em Roma.
"Outro modelo de Igreja para o século XXI: uma Igreja em rede, à maneira
de um gigantesco arquipélago que cubra a face da Terra, com diferentes nós em
diferentes partes do mundo, inter-relacionados entre si e todos religados a um
nó central, que não centralizador, que, na atualidade, está no Vaticano. No
Vaticano ou noutras partes do planeta, todos os anos se reuniria uma
representação universal de bispos, sacerdotes, religiosas e religiosos, leigos
(homens e mulheres), todos sob a presidência do Papa, para debater a situação
da Igreja no mundo e adotar as decisões pertinentes.”
Num mundo globalizado, o Papa tem um papel crucial como líder supremo da Igreja
Católica, continuando a ter a última palavra. Mas, com um Sínodo universal, no
qual também os leigos têm direito a voto, se ele adotar uma decisão com uma
maioria clara (dois terços?), o Papa deveria aceitá-la e "agir em
consequência" ou demitir--se. Por outro lado, é preciso atender às
diversas culturas, com a inculturação, e não confundir, pois isso seria
"um erro mortal", como já tinha prevenido J. Maritain, por exemplo, "latinidade
e catolicismo ou ocidentalismo e catolicismo".
Padre Carlos.
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