Não é só justiça, tem
que ter algo de misericórdia!
Existe
hoje um consenso entre os teólogos. que Jesus de Nazaré foi nesta terra , talvez o
único homem , que conseguiu vivenciar e saber fazer uma experiência verdadeira do Deus Pai, sem alterar devido ao medos,
ambições e fantasmas que, constantemente , as diversas religiões projetam sobre
a divindade. Se me perguntasse hoje qual o nome de Deus, eu dia para essa
pessoa: O seu nome é misericórdia. E a compaixão é o modo de ser de Deus.
Foi
dentro de uma espiritualidade da misericórdia, que Jesus passa a contar
histórias que abalam uma Igreja clericalizada, centrada no culto. Lá está, por
exemplo, o bom samaritano. Um homem foi espancado e roubado, ficando meio morto
à beira da estrada. E passou por ali um sacerdote, que se desviou para nem
olhar para o rosto daquele coitado. O mesmo fez um levita que servia no Templo.
Mas um samaritano, estrangeiro e considerado pecador pelos judeus, que não
frequentava o Templo, comoveu-se, aproximou-se, cuidou dele e pagou
adiantadamente na estalagem, para o tratarem, prometendo que, na volta, pagaria
o que faltasse. O doutor da Lei tinha perguntado: "Quem é o meu
próximo." Agora, é Jesus que lhe pergunta: "Quem foi o próximo
daquele desgraçado?" "O samaritano." E Jesus: "Vai e faz o
mesmo." Não o mandou para o Templo. De que vale o culto (Missa a minha
oração) desligado da justiça e da misericórdia, da proximidade do excluído e do
pobre?
Para
a salvação da nossa alma, Ele não fala de religião, templo e culto, mas de
justiça e de misericórdia: "Tive fome e destes-me de comer, tive sede e
destes-me de beber, era peregrino e recolhestes-me, estava nu e destes-me que
vestir, adoeci e visitastes-me, estive na prisão e fostes ter comigo." E
vai haver um espanto: "Senhor, quando foi que te vimos com fome e te demos
de comer, ou com sede e te demos de beber? Quando te vimos peregrino e te
recolhemos, ou nu e te vestimos? E quando te vimos doente ou na prisão, e fomos
visitar-te?" E o Deus de Jesus responde: "Em verdade vos digo: Sempre
que fizestes isto a um destes meus irmãos mais pequeninos, a mim mesmo o
fizestes. Sempre que deixastes de fazer isto a um destes pequeninos, foi a mim
que o deixastes de fazer.”.
É
arrasador: em primeiro lugar o que decide a salvação não são atos de culto, mas
os que contribuíram para um mínimo de dignidade humana. Por isso, Jesus, com
escândalo de muitos, porque comia com publicanos e pecadores, coloca na boca de
Deus as palavras do profeta: "Quero misericórdia e não sacrifícios."
O teólogo José M. Castillo comenta de modo frontal: "Jesus afirma aqui que
Deus quer que os seres humanos se comovam com bondade e misericórdia para com
os outros, mesmo que sejam maus e até se a prática da bondade implicar a
violação de uma lei religiosa. Isto, embora seja um escândalo para os mais
puritanos, é o que o Evangelho diz", indo até mais longe, ao estabelecer
uma "antítese" entre a "misericórdia" e o
"sacrifício", isto é: "O que Jesus diz é que, se for preciso
escolher entre a "ética" e o "culto" (entre a
"justiça" e a "religião"), o que vem primeiro é a ética, a
honradez, a defesa da justiça e os direitos das pessoas. Deus não quer que as
nossas consciências fiquem tranquilas com missas, rezas, devoções e coisas do
género." É preciso restituir a todas as pessoas o seu bem maior: a
dignidade.
E
aqui estão as chamadas obras de misericórdia. Misericórdia quer dizer,
etimologicamente, olhar com o coração para a miséria do outro, com compaixão, o
que significa, também a partir da origem desta palavra pode entender como,
sofrer com o outro, fazendo seu o sofrimento dele. A partir daí, há uma comoção
e uma reação, que levam a comprometer-se com a erradicação do sofrimento ou,
pelo menos, com o seu alívio, de forma imediata.
Padre Carlos
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