terça-feira, 28 de maio de 2019

ARTIGO | Meu Papa não é herético? (Padre Carlos)*




Meu Papa não é herético?


            Faz exatamente quinze dias, que um grupo de académicos, teólogos e padres católicos dirige-se ao colégio dos bispos da Igreja Católica invocando duas razões: acusar o Papa Francisco do "delito canónico de heresia" e requerer que os bispos façam o que é preciso para que ele renuncie publicamente a essas heresias ou se lhe aplique o estabelecido canonicamente, incluindo a remoção do cargo papal.
            Em síntese, Francisco é acusado de aceitar que católicos divorciados e recasados civilmente possam ser admitidos, em certas circunstâncias, à comunhão; acusado de não se opor de forma mais contundente ao aborto; acusado de, no diálogo ecuménico com os luteranos, manifestar acordo com Lutero em alguns pontos; acusado de acolher os LGBT; acusado de afirmar que a diversidade de religiões não só é permitida por Deus, mas querida; acusado de ter dado cobertura e mesmo ter promovido personalidades que também dão cobertura a estas heresias, aceitam a moralidade de atos homossexuais e/ou praticaram ou encobriram abusos sexuais de menores...
            O que é que os autores da carta querem? Que não haja liberdade religiosa? Querem o uniformismo? Não será a unidade na variedade a riqueza da vida também no domínio religioso? Estou convicto de que Deus se revelou de modo definitivo e inultrapassável em Jesus. No entanto, o Jesus que disse: "Eu e o Pai somos um" também disse: "O Pai é maior do que eu." O que é que isto quer dizer? Evidentemente, as religiões não são todas iguais, mas elas todas, na medida em que não sejam contra o Humanum, pelo contrário, o promovam, são caminhos para Deus, que está para lá de todas elas. Não se pode esquecer que as religiões não existem para elas mesmas, pois estão ao serviço de Deus e da humanidade. E o Papa esforça-se no combate a favor da paz, concretamente com o islão moderado, a favor do diálogo inter-religioso. Sem afastar nem postergar a identidade cristã, evidentemente.
            Quando Francisco enfrenta estas forças que tentam ressuscitar a cristandade em sua versão mais perversa, ele quer que saibamos que a Igreja não pode deixar de ser sacramento da misericórdia de Deus no mundo, em todos os tempos e para a humanidade inteira. Portanto, cada cristão está chamado a ser testemunha da misericórdia, e isto acontece no caminho da santidade. Pensemos em quantos santos se tornaram misericordiosos porque deixaram que seus corações se enchessem de misericórdia divina. Deram corpo ao amor do Senhor, derramando-o nas múltiplas necessidades da humanidade sofredora. Neste florescer de tantas formas de caridade é possível entrever os reflexos da face misericordiosa de Cristo.
            Somente trazendo o povo que foi durante séculos afastados da mesa da Eucaristia e agindo como um Pai Misericordioso poderemos ser digno do nosso pastoreio e com ajuda dos excluídos buscaremos reconstruir, vivendo lado a lado, rezando e pregando com eles. Diante de tal constatação, é que Francisco foi percebendo que a vontade do Senhor é a reconstrução da Igreja viva. Francisco não esta fazendo uma reforma, ele esta fazendo uma reconstrução, devolvendo a Igreja aos pobres, uma verdadeira revolução!


Padre Carlos

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