Francisco
e seus inimigos!
Vocês devem ter,“clareza de consciência”, não há lugar para os
sorrateiros entre os filhos de Santo Ignácio.
O
Papa Francisco nos últimos tempo, tem chamado a atenção dos fieis sobre a maior
das crises que atravessa a Igreja e apresenta como os principais motivos o clericalismo e, consequentemente, o
carreirismo, que ele, desde o princípio, diz que constituem "a peste da
Igreja", sempre em conexão com a Cúria Romana, a corte, de que ele diz que
é "a lepra do papado". Neste contexto, Francisco associa "abusos
sexuais, de poder e consciência". Disse, há uns meses, ao episcopado
chileno: "Há uma ferida aberta, dolorosa, e até agora foi tratada com um
remédio que, longe de curar, parece tê-la aprofundado mais na sua espessura e
dor. Os problemas que hoje se vivem dentro da comunidade eclesial não se
solucionam apenas abordando os casos concretos e removendo pessoas.
Constituiria grave omissão da nossa parte não aprofundar nas raízes. Essa
psicologia de elite ou elitista acaba por gerar dinâmicas de divisão,
separação, círculos fechados, que desembocam em espiritualidades narcisistas e
autoritárias nas quais, em vez de evangelizar, o importante é sentir-se
especial, diferente dos outros, pondo assim em evidência que nem Jesus Cristo
nem os outros interessam verdadeiramente. Messianismos, elitismos,
clericalismos, são todos sinónimos de perversão no ser eclesial."
Não
podemos negar, que estas palavras do Santo Padre, caracteriza como "duras,
corajosas, clarividentes", pois mostram que é preciso ir à raiz deste
tsunami das crises morais do clero e atacá-la enquanto "problema estrutural",
portanto, além da responsabilidade das pessoas concretas. Evidentemente, o
celibato imposto tem de ser considerado, mas como parte de uma estrutura
clerical muito mais ampla e um dos seus pilares. Alguns dos elementos que fazem
parte desta estrutura: "concentração do poder nas mãos da clerezia",
poder hierarquizado e apoiado na contraposição clérigos/leigos; um poder
patriarcal e machista, que exclui as mulheres; a carreira e ascensão no poder
fazem-se mediante dois mecanismos complementares: "a obediência e/ou a
hipocrisia"; "uma concepção e prática dualista e maniqueia"
concretamente em relação à sexualidade; "sobrevalorização do
celibatário", considerado mais perfeito do que o casado, porque mais
próximo de Deus; o celibato obrigatório é "uma imposição legal" para poder
pertencer a esta classe superior; o clero está à frente de "comunidades
reduzidas a lugares de culto e serviço religioso à volta do padre, sem voz nem
voto nas decisões de base: convertidas em grupos menores de idade...".
Francisco quer renovar a Igreja, levando-a às
origens, com o Evangelho de Jesus. Tolerância zero para a pedofilia.
Transparência nas contas do Banco do Vaticano. Reforma profunda da Cúria. Uma
Igreja fraterna, pobre, em saída para as periferias geográficas e existenciais.
Uma Igreja viva, que não é museu. Sem clericalismo, capaz de se aproximar dos
divorciados recasados, dos homossexuais, que são católicos como os outros (o
problema não é ser homossexual, o problema é "o lóbi gay",
diz). Francisco também está próximo dos mais desfavorecidos e critica o
capitalismo desenfreado, escreveu uma encíclica, a Laudato Sí, apelando à
necessidade de salvaguardar a Terra, criação de Deus e nossa casa comum, e
também à necessidade de humanitariedade para com os migrantes e refugiados...
Evidentemente,
os rigoristas fariseus e os lóbis económicos não gostam e atacam-no ferozmente,
acusando-o inclusivamente de heresia. Recentemente, o arcebispo Carlo Maria
Viganò, num golpe covarde, pretendeu acusá-lo de cumplicidade. Francisco,
naquela sabedoria só dele, disse aos jornalistas que fossem profissionais e
cumprissem o seu dever de investigação, e eles cumpriram e a imprensa
internacional desmascarou o ex-núncio Viganó e os seus apaniguados, envolvidos
em mentiras e contradições. E a Igreja universal, que queriam ver desunida, tem
vindo massivamente a manifestar o seu apoio incondicional a Francisco. Também a
Conferência Nacional dos Bispos do Brasil ( CNBB ), o fez. Para lá dos
eclesiásticos, é longa a lista de políticos e figuras públicas que vieram em
defesa de Francisco.
Quem
já anunciava que dentro de semanas ou meses teríamos a renúncia de Francisco e
um Papa conservador a suceder-lhe devia saber que ele já preveniu que não sai a
pontapé. Como tenho repetido nestes últimos meses, estou convicto de que
Francisco, nesse encontro admirável de franciscano e jesuíta, não se demite nem
se deprime. E não se ficará só com pedidos de perdão e exigência de justiça,
incluindo a justiça civil. Até porque é preciso ir mais longe e fundo. Pode vir
aí um Sínodo - Francisco está continuamente falando da sinodalidade da Igreja,
que quer dizer necessidade de caminhar juntos e em comum -, um Sínodo enquanto
reunião universal de toda a Igreja, com representação de bispos, mas também de
padres, de religiosos e de religiosas, da Cúria, de leigos e de leigas,
portanto, eles e elas, na devida proporção, sob a presidência do Papa. Para
debater esta e muitas outras questões. A que se deve esta tragédia? Como
caminhar para estruturas mais democráticas na Igreja? Que novo tipo de padre?
Ordenar homens casados? Pôr fim à lei do celibato? Qual o papel das mulheres na
Igreja? É legítimo continuar a discriminá-las, contra a vontade de Jesus? O que
é que as impede de poderem presidir à celebração da Eucaristia? Que moral
sexual? O que é que a Igreja pensa de si mesma, da sua identidade e missão?
Como é que deve ir ao encontro da Humanidade atual, com os seus novos
problemas, questões de bioética, questões que têm que ver com o trans-humanismo
e o pós-humanismo, a justiça social, os direitos humanos, o diálogo ecuménico e
inter-religioso, a paz num mundo globalizado...
Padre
Carlos.
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