segunda-feira, 10 de junho de 2019

ARTIGO | À esquerda e as ruas! (Padre Carlos)






À esquerda e as ruas!


Uma das coisas que chamou minha atenção nos últimos anos foi à indiferença e apatia não só do povo como já era esperado, mas pelo movimento popular, pela CUT, MST e a Igreja Católica, em relação aos ataques as conquistas não só trabalhistas, mas direitos que representam a vida. As ruas, as manifestações, sempre foram uma ação da esquerda. Com as manifestações de 2013, podemos presenciar a troca de espaços político e uma presença da direita brasileira ocupando espaços que até pouco tempo era de exclusividade dos socialistas e do movimento estudantil. Pensei que tínhamos perdidos a capacidade de mobilização. Às vezes me perguntava: será que a Sociedade Civil e os indivíduos concluíram que a democratização da sociedade não mudou essencialmente as suas vidas? Como não há bem que sempre dure, nem mal que nunca se acabe, aconteceu felizmente o reencontro da esquerda brasileira com os movimentos de massa. As manifestações contra o fascismo têm levado ao surgimento de um novo movimento estudantil e de um sindicalismo menos fragmentado. Mas, infelizmente isto não é tudo.
Para a maioria dos eleitores, a política é algo ausente do seu cotidiano. Eles vivem o dia-a-dia e ponto. Parece que a política não lhes diz respeito. Até torcem o nariz quando alguém fala deste assunto. Mas estas mesmas pessoas aparentemente indiferentes muitas vezes surpreendem. Se hoje fazem arminha dentro das igrejas, na década de 1980, foram às ruas e praças públicas para reivindicar, democracia e liberdades políticas.
Hoje, acredito que a indiferença e apatia estejam dando lugar a uma i
nsatisfação. Este é o grande combustível, que impulsionou as reformas contra a classe trabalhadora e os mais pobres no Congresso Nacional. O desempenho dos políticos nos últimos anos fortaleceu o preconceito contra a política. Cada vez mais, esta é vista como algo por natureza imoral e antiética, relacionada ao egoísmo e aos privilégios.
Não é novidade que os políticos há muito padecem da rejeição popular. O mesmo se pode afirmar quanto às instituições políticas. Aliás, diga-se de passagem, e talvez em favor dos políticos tupiniquins, isto não se restringe ao Brasil. Em todo lugar, estas classes ‘gozam’ da antipatia e descrédito dos eleitores.
Para os humoristas, não falta assunto para ironizar os políticos e os responsabilizam pelas desgraças. Ironia à parte, os comediantes populares apenas expressam o que o senso comum pensa sobre a política. Mesmo com o voto obrigatório, muitos nem comparecem às urnas e aumenta a soma dos votos nulos e brancos. Ainda que consideremos apenas os que votam, vemos que a maioria dos eleitores ‘desligam-se’ da política quase que simultaneamente à declaração dos resultados oficiais.

O eleitor comum tem razões justificáveis para negar a política. A própria atuação dos políticos contribui para a sua execração. Aliás, observe que mesmo sendo criado o fundo eleitoral com dinheiro público que impõem limite de gastos para campanhas de candidatos a presidente, governador, senador e deputado, sabem que a relação de promiscuidade do público com o privado vai continuar. Desta forma, podemos entender que o financiamento de algumas candidaturas sempre contará com o apoio e simpatia do mercado, afinal política é a verdadeira luta de classe. Será que eles realmente defendem o bem comum? Ou, prioritariamente, eles defenderão interesses próprios e dos grupos econômicos que os representam? Isso sem contar os casos onde os representantes diretos destes grupos se elegem com um discurso em favor do povo. Sempre o povo! Qual o maior interesse dos políticos em geral? Se reeleger. Por isto, foi de fundamental importância o reencontro com os movimentos de massa e as ruas. O povo tem que sentir seu poder e perceber que indo para as ruas fará a diferença, sempre ordeira, democraticamente, sem afronta, e sem temor. Lembro-me do político íntegro Ulisses Guimarães e de uma frase que marca perfeitamente esse distanciamento da esquerda nestes últimos tempos com as ruas. Ulisses Guimarães disse: “Só o povo nas ruas mete medo em político”. E me permito completar: medo da verdade!



Padre Carlos

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